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Não vamos intervir

Não vamos intervir, afirma porta-voz de Milei sobre foragidos do 8 de janeiro


Em entrevista exclusiva ao correspondente do SBT em Buenos Aires, Marcelo Torres, nesta terça-feira (18), o porta-voz da presidência Argentina, Manuel Adorni, afirmou que o governo não irá intervir no caso dos foragidos do 8 de Janeiro que estão no país. Por ser um assunto judicial, será tratado, segundo ele, pela instituição competente.

O porta-voz também confirmou o recebimento de uma lista com os nomes de pessoas foragidas entregue pela Embaixada do Brasil em Buenos Aires, mas disse que não pode transmitir as informações "por questões de segurança da Argentina".

"Em princípio, é um tema judicial no qual não intervimos, pois é outro poder do Estado no qual não temos ingerência nem queremos ter", afirmou. "Obviamente, temos informações. No caso, o que tenho não posso transmitir por questão de segurança da Argentina, mas cumprimos efetivamente com o que a justiça determina".
Questionado sobre uma possível interferência do governo Milei em caso de pedidos de asilo, Adorni foi enfático e voltou a repetir que não haveria interferência política na questão.

"Nós não nos intrometemos em questões que são alheias ao Poder Executivo Nacional. A qualidade de refugiados é determinada por uma comissão independente, nós não definimos quem é refugiado e quem não é", afirmou. "Não vamos intervir porque acreditamos na independência das instituições e dos poderes, e, neste caso, da Comissão que efetivamente arbitra quem é refugiado e quem não é. Não nos envolvemos nisso", ressaltou.

Na segunda-feira (17), pelo menos sete brasileiros foragidos da Justiça e condenados pela participação nos atos antidemocráticos iniciaram o processo de solicitação formal de asilo junto à Comissão Nacional de Refugiados (Conare). A informação é do site argentino La Politica Online, que afirmou se tratar de 4 homens e 3 mulheres.

A relação de Javier Milei e do presidente Lula também foram mencionados na entrevista, assim como o Mercosul. O bloco econômico foi bastante criticado pelo ultraliberalista durante a campanha à Casa Rosada. Milei chegou a sugerir deixar a organização intergovernamental regional.

Segundo Adorni, "não está na agenda do país sair do Mercosul e não há razão para estar na agenda".

Leia a entrevista na íntegra:
Marcelo: Vamos começar falando da relação entre Brasil e Argentina. Parece que a relação pessoal entre os dois presidentes continua fria, mas o institucional avança.

Manuel Adorni: Bem, são presidentes que, como eu sempre digo, não são só presidentes, acima de tudo são pessoas com diferenças claras, visíveis para qualquer um, ideologicamente estão nas antípodas ou estão bastante distantes um do outro, e isso não tem nada a ver com as relações entre os povos, com as relações entre os brasileiros e os argentinos.

Na verdade, nos últimos tempos, houve colaboração entre ambos os países. Houve colaboração na catástrofe natural que os brasileiros viveram no sul do Brasil em relação às inundações, tivemos a colaboração do Brasil quando tivemos um inconveniente com a importação de gás e tudo funciona institucionalmente de maneira maravilhosa. Comercialmente, em nosso comércio com o Brasil, todo mundo sabe que para nós, o Brasil é um dos nossos principais parceiros comerciais, mas, além disso, é um dos maiores destinos de nossas exportações industriais. Realizamos essas exportações para o Brasil, e para nós o Brasil foi e sempre será um grande parceiro comercial e isso não mudou.

De fato, além das reuniões entre o Ministério das Relações Exteriores da Argentina e as autoridades brasileiras, também há efetivamente reuniões entre empresários e fomentamos essa relação comercial, então nada tem a ver o que ocorre em um debate, uma distância que possa haver nas ideologias ou nas posições dos presidentes a título pessoal, com o que é a relação dos povos, as relações diplomáticas e as relações comerciais. Não tem absolutamente nada a ver e, de fato, está demonstrado pela excelente relação que temos em matéria comercial e diplomática.

Marcelo: Em abril o presidente Milei enviou uma carta ao presidente Lula propondo um encontro entre os dois para tratar as questões entre os países. As informações de bastidores que obtive dão a entender que a carta foi considerada um pouco seca. Não sei se da parte do Lula, não sou assessor dele, poderia haver o desejo, por exemplo, de um pedido de desculpa pelas coisas que Milei falou sobre o Lula durante a campanha. Eu queria te perguntar, o que estava escrito na carta? E o que a Argentina espera do presidente Lula em resposta a essa carta?

Manuel Adorni: Além dos detalhes da carta e do conteúdo subjetivo que possa ter parecido a um ou outro, acredito que o que deve ser valorizado é a relação entre os países. Historicamente, além de no futebol, sempre fomos países irmãos, e não só comercialmente, mas também somos os dois principais países do continente, e, no fim das contas, da América do Sul. Nós valorizamos isso. Depois, se o encontro parecer mais ou menos sério, seco, ou se o encontro ocorrer em algum momento nas próximas semanas ou somente em novembro, no contexto do G20, isso não sabemos e a própria dinâmica das diferentes agendas irá determinar. Acho que se fez um grande alarde sobre algo que não deveria haver. Estamos nos intrometendo em questões protocolares, em questões de política ou de relações bilaterais que não têm nada a ver, repito, não têm a ver com a verdadeira relação que temos com o Brasil, como destaquei na pergunta anterior.

Acho que é preciso entender que as relações entre países precisam ser maduras e tudo o que estiver fora disso deve ser tratado com o valor que merece. Vamos tirar o dramatismo da situação. Você me pergunta como está a relação diplomática com o Brasil: está em um excelente momento. Como está a relação comercial com o Brasil? Seguramente com muito por fazer, mas está em um excelente momento, de diálogo permanente e com empresários motivados a investir na Argentina, com empresas brasileiras interessadas em investir na Argentina. Vamos valorizar isso e deixar todo o resto apenas como uma questão protocolar, que não nos afete mais do que já nos afetou.

Marcelo: É um desejo do presidente Milei ter um encontro com o presidente Lula?

Manuel Adorni: Bem, não sei e, repito, dependerá da vontade de ambas as partes e também das agendas. Como disse, de fato se encontraram e se cumprimentaram nos últimos dias na Itália, no G7. Não conversaram, mas também não conversaram com outros líderes. Gosto de, repito, tirar o dramatismo de algumas questões. Com outros líderes, como a diretora do Fundo, teve três encontros no G7 e não significa mais nem menos do que isso. Se cumprimentaram, foi um encontro casual, não houve nenhuma reunião bilateral, nem nenhuma conversa além de um cumprimento. Quando o encontro acontecer, acontecerá naturalmente e será no interesse de ambos em continuar fortalecendo a relação entre os países.

Marcelo: Vamos falar agora de Mercosul. Qual é o nível de comprometimento da Argentina com o Mercosul? Qual é a visão da Argentina para o Mercosul e para esses acordos que podem ser feitos tanto com a China quanto com a União Europeia?

Manuel Adorni: Vamos ver, nós somos promotores do livre comércio como parte de nossa essência, nossa essência é a liberdade e, dentro dessa liberdade, a liberdade de comércio é um dos grandes pilares. A Argentina foi muito prejudicada por nossa própria política, por nossos próprios governantes e por nossa história recente, devido ao afastamento do mundo e à concepção de que deveríamos viver com o que temos e nos afastar do mundo, que só nos tira dólares e nos torna mais pobres. Nos afastamos dessa visão, porque não acreditamos nela, acreditamos no livre comércio e que, evidentemente, deve ser promovido para ser feito pelos privados, certo?

Como já disse o presidente, podemos ter diferenças ideológicas profundas com a China ou com o Lula ou, digamos, com qualquer outro país ou dirigente, mas isso de nenhuma maneira vai interferir em nenhum acordo comercial entre privados ou entre países, e se efetivamente um acordo de livre comércio pode ser feito com qualquer país do mundo, seja China ou qualquer outro que beneficie a todos, será bem-vindo. E isso me parece ser uma concepção, como já disse, que vai além de um possível acordo com a China, é uma filosofia que temos de governar a Argentina por um caminho de maiores liberdades. E por que vamos impor com quem você deve negociar, se com a China ou com os Estados Unidos, quando o que queremos é negociar livremente com o mundo? Porque mais comércio gera mais trabalho, mais investimentos e mais crescimento para a Argentina. E espero que o Mercosul siga esse caminho também. No fim das contas, o Mercosul tem que funcionar como um bloco que beneficie os países que o compõem, mas também que, como bloco, sejamos favorecidos em nosso comércio e nossas relações com o resto dos países que não fazem parte do Mercosul. Porque, como eu disse, somos contra tudo que limite esse comércio, pois limitar o comércio limita a liberdade, e limitar a liberdade vai contra o que pregamos para a Argentina.

Marcelo: A princípio, o presidente Javier Milei, principalmente durante a campanha, chegou a ventar a possibilidade de que houvesse acordo de país a país, não necessariamente negociando como bloco, essa é uma visão já caiu no governo?

Mauel Adorni: Nós pertencemos ao Mercosul e hoje nos ajustamos ao que os países do Mercosul, é claro, estipulam. As ideias de campanha, e a pergunta é muito oportuna porque ocorre também com outras questões, não apenas em termos de Mercosul, este governo tem apenas seis meses de mandato, assumimos em 10 de dezembro do ano passado. A Argentina estava despedaçada, despedaçada culturalmente, socialmente, economicamente, sem falar das variáveis que certamente vocês acham horrorosas: um nível de inflação de três dígitos e descontrole que, felizmente, conseguimos evitar; um comércio internacional abalado; tínhamos inadimplência com os importadores, digo, o desastre que havia na Argentina em todos os aspectos, mas especialmente na questão econômica, faz com que não possamos pretender solucionar as coisas de um dia para o outro.

Por que esclareço isso? Porque na sua pergunta está implícito que abandonamos algumas ideias que tínhamos (na campanha) e, na verdade, não é assim. Para ordenar essa Argentina, que repito, sempre vamos promover que se possa negociar livremente com todo o mundo, é claro, em igualdade de condições e sem nada que prejudique a liberdade do livre comércio dos argentinos. Mas sim, vamos defender essa ideia de liberdade e não abandonamos nada, certo? O que fizemos apenas foi seguir passo a passo em uma Argentina que estava devastada, fazendo o que podemos com as ferramentas que temos, no tempo que a própria política, a burocracia e o tempo dos processos nos permitem.

Marcelo: O passo a passo não contempla sair do Mercosul?

Manuel Adorni: Neste momento, não. Não está na agenda sair do Mercosul, e não há razão para estar na agenda sair do Mercosul. Sim, melhorar e superar, nós não viemos para nos ater a nada, viemos para melhorar o que temos, para inovar e seguir em frente. Mas não vamos fazer nada que vá contra a liberdade e, muito menos, contra os argentinos.

Marcelo: Um assunto agora que está muito em alta no Brasil, que é a questão dos fugitivos do 8 de Janeiro. O Brasil teria enviado para cá uma lista com 143 nomes para a Argentina tentar localizar aqui. Eu queria saber o que está sendo feito pela Argentina sobre isso?

Manuel Adorni: Em princípio, é um tema judicial no qual não intervimos, por ser outro poder do Estado no qual não temos ingerência nem queremos ter. Esperamos que ninguém queira tê-la que não pertença estritamente ao Poder Judiciário. Obviamente, temos informações e, claro, o que você me disse é correto, deixemos a justiça atuar. No caso, a informação que tenho não posso transmitir por questão de segurança da Argentina, mas cumprimos efetivamente com o que a justiça determina. Nós não fugimos da lei, não evitamos a lei, simplesmente cumprimos com os passos que a justiça nos indica.

Marcelo: Tem uma questão ideológica envolvendo tudo isso que é a questão da associação das pessoas que foram presas durante o 8 de janeiro, dizendo que são presos políticos. Inclusive, há um mês e meio, teve uma comissão aqui na Argentina de deputados do Brasil, entre eles Eduardo Bolsonaro, tiveram no Congresso defendendo essa visão de que são presos políticos e merecem asilo político. O governo argentino concorda com essa visão?

Manuel Adorni: Nós, repito, nós não nos intrometemos em questões que são alheias ao Poder Executivo Nacional. A qualidade de refugiados é determinada por uma comissão independente, nós não definimos quem é refugiado e quem não é. Inevitavelmente, há determinadas questões que conferem ou complementam essa qualidade de refugiados. Entendo que a comissão define, com toda a informação que está coletando, se uma pessoa pode obter o status de refugiado ou não. Isso é absolutamente alheio a nós e não temos por que opinar sobre esse tema.

Marcelo: Por sua resposta, me parece que não haverá interferência política nesse caso?

Manuel Adorni: Nós não interferimos politicamente, primeiro porque não interferimos politicamente em questões que são de política interna ou questões judiciais de outro país.

Marcelo: Mas o presidente tem o poder de interferir se quiser, não?

Manuel Adorni: Não vamos intervir porque acreditamos na independência das instituições e dos poderes, e neste caso da Comissão que efetivamente arbitra quem é refugiado e quem não é. Não nos envolvemos nisso.

agoranoticiasbrasil.com.br/

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