São Paulo — Um relatório de inspeção concluído neste mês por auditores do
Tribunal de Contas da União (TCU) identificou a "existência de controles
frágeis" dentro do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que permitem
"descontos indevidos em larga escala" feitos por associações diretamente na
folha de pagamento dos aposentados.
Mantida sob sigilo, a fiscalização preliminar destaca o crescimento
"impressionante" do número de associados filiados por essas entidades nos
últimos anos, com aval do INSS, e do valor arrecadado por elas com "mensalidade
associativa", conforme revelado pelo Metrópoles na reportagem sobre a farra do
desconto em aposentadorias.
Segundo o relatório do TCU, o número de filiados saltou 150% em dois
anos, de 2,2 milhões de aposentados em 2021 para 5,5 milhões em dezembro de
2023. Neste mesmo período, a receita anual das 29 entidades habilitadas pelo
INSS a praticar o desconto direto nos contracheques subiu de R$ 544,7 milhões
para R$ 1,55 bilhão.
"Esses crescimentos expõem a necessidade de o INSS possuir controles
robustos com o propósito de evitar descontos de mensalidades indevidos", afirma
a auditoria do TCU.
Como mostrou o Metrópoles, esse crescimento ocorreu em meio a uma
avalanche de reclamações e processos judiciais movidos por aposentados contra
essas associações por descontos indevidos, feitos sem autorização prévia dos beneficiários
do INSS, como exige a lei. Há casos de falsificação de assinaturas e de uso de
gravações de telemarketing sem validade jurídica para justificar as filiações.
Durante a inspeção, os auditores do TCU constataram que a divisão do INSS que fiscaliza os descontos nos benefícios tem apenas três servidores, que "os termos de filiação e de desconto de mensalidade associativa não são rotineiramente apresentados pelas entidades", conforme exigência legal, e que "não foram aplicadas penalidades em decorrência de irregularidades" em 2023, quando as queixas na Ouvidoria do INSS por causa de descontos indevidos subiram 560% em relação ao ano anterior.
Direção do INSS tentou esconder farra dos descontos
em aposentadorias
Os auditores ainda destacam que a medida que determinou o bloqueio para
qualquer tipo de desconto no benefício para quem se aposentou a partir de
setembro de 2021 — desde então, o segurado que quiser se associar a uma
entidade ou fazer um empréstimo consignado precisa fazer o desbloqueio no INSS
— não coibiu os abusos porque 97% das aposentadorias com descontos associativos
são de segurados que se aposentaram antes dessa data.
No relatório, eles também afirmam que, embora o INSS tenha publicado uma
norma neste ano exigindo o reconhecimento biométrico do aposentado para liberar
novos descontos, "esse requisito ainda não foi posto em prática". Para os
auditores, "é urgente a adoção de medidas de segurança para que esses novos
requisitos de segurança sejam postos em prática o mais rapidamente possível".
"Identificou-se a existência de descontos de mensalidade associativa não
autorizados, cujas principais causas são a ausência de verificação da filiação
do beneficiário e de sua autorização previamente à averbação dos descontos; a
fragilidade na ferramenta de bloqueio e desbloqueio para a averbação de
descontos; e a falta de avaliação periódica das reclamações referentes a
descontos indevidos", concluíram os auditores do TCU.
Cobranças ao INSS
O relatório de inspeção do TCU sobre os descontos em aposentadorias está
sob relatoria do ministro Aroldo Cedraz. No documento, os auditores propõem que
o tribunal determine que o INSS obtenha, no prazo de 60 dias, todos os termos
de filiação em vigor, com autorização e documento de identificação dos aposentados,
e que nos casos em que esses documentos não forem devidamente apresentados, os
descontos sejam interrompidos e os valores descontados irregularmente,
devolvidos.
Os técnicos também recomendam que, até que haja a efetiva implementação
da assinatura eletrônica avançada e da biometria, previstas na norma publicada
em fevereiro pelo INSS, somente sejam aceitas novas filiações com toda a
documentação exigida por lei.
Eles pedem ainda que o INSS institua, em até 90 dias, uma avaliação
periódica sobre reclamações de descontos indevidos e, "caso identifique
irregularidades frequentes ou substanciais, aplique as penalidades previstas na
legislação e nos acordos de cooperação técnica".
No último dia 4/4, o TCU encaminhou o relatório de inspeção com as
determinações propostas pelos auditores para o presidente do INSS, Alessandro
Stefanutto, para que ele "apresentar comentários" e "sugestões de eventuais
alternativas" ao que foi proposto no documento. O prazo dado para resposta
termina nesta terça-feira (16/4).
O INSS afirmou ao Metrópoles que "ainda não tem conhecimento do conteúdo
do relatório do TCU" e que "tão logo receba o documento, dará seu
posicionamento".
Após as reportagens publicadas pelo Metrópoles em março, a farra dos
descontos em aposentadorias virou alvo de investigações da Controladoria-Geral
da União (CGU) e do próprio INSS, órgão responsável por firmar os "acordos de
cooperação técnica" que permitem às associações aplicar "desconto de
mensalidade associativa" nos benefícios de aposentadoria e pensão.
A investigação, que se restringia a seis entidades inicialmente citadas
pelo Metrópoles, foi ampliada para abranger todas as associações que firmaram
contrato desde 2023. Mais recentemente, o INSS também anunciou a interrupção de
repasses novos às entidades até que elas instalem sistemas de biometria e se
adequem a normas estabelecidas pelo órgão para evitar fraudes.
Fonte: agoranoticiasbrasil.com.br/