A Câmara da Argentina aprovou a chamada "Lei Ônibus", o pacote de
reformas políticas e econômicas de Javier Milei após uma maratona de 30 horas
de debates e discussões acaloradas que se arrastava desde que a quarta-feira (31).
Os deputados ainda devem discutir cada um dos mais de 380 artigos
individualmente a partir da próxima terça-feira (6).
Apesar de A Liberdade Avança, o partido de Milei, ter apenas 38 dos 257
deputados, o governo conseguiu ultrapassar com folga a marca dos 129 votos
necessários para passar a "Lei Ônibus" com apoio da oposição dialoguista. Foram
144 votos a favor do projeto e 109 contrários. Para isso, a Casa Rosada teve
que abrir mão de quase metade dos 664 artigos que eram previstos originalmente,
quando o texto foi enviado ao Congresso.
– A história se lembrará com honra de todos aqueles que compreenderam o
contexto histórico e decidiram acabar com os privilégios da casta e da
república corporativa em favor do povo, que foi empobrecido e levado a fome
durante anos pela classe política – celebrou o gabinete de Javier Milei nas
redes sociais acrescentando que espera contar com a "mesma grandeza" na votação
individual dos artigos para que a redação final siga para o Senado.
O governo já havia abandonado o capítulo fiscal da reforma e chegou a
dizer que não faria novas concessões, mas voltou a ceder em alguns dos pontos
considerados mais sensíveis do projeto. A Casa Rosada reduziu o número de
empresas estatais que serão privatizadas e os poderes extraordinários que o
Executivo busca para passar reformas futuras sem o Congresso.
Ainda assim, o terceiro dia de sessão foi marcado por intensas
negociações acerca do imposto para uma Argentina Inclusiva e Solidária (PAIS),
que incide sobre transações em moeda estrangeira. As províncias pressionaram por
uma fatia do imposto e deputados de Córdoba ameaçaram reduzir o apoio às
declarações de emergência que ampliam os poderes de Javier Milei.
O governo, por outro lado, pediu que a discussão fosse deixada para
depois da "Lei Ônibus". No fim da tarde, o ministro do Interior Guillermo
Francos foi à Câmara e se reuniu com um grupo de deputados da oposição
dialoguista para destravar a negociação.
– Agora vem a parte mais importante, que será a discussão ponto a ponto,
porque vários dos artigos podem cair por não terem maioria – alerta o cientista
político argentino Carlos Fara em entrevista ao Estadão.
– Foram cometidos erros políticos e de negociação pelo caminho, mas o
governo tem um incentivo para enfrentar as próximas sessões de maneira
diferente – acrescentou.
Depois da tensa maratona de votações na Câmara, o texto ainda precisará
passar pelo Senado, onde o governo tem apenas sete dos 72 senadores. Mesmo
sendo minoria, a Casa Rosada espera contar com as mesmas alianças que
garantiram a aprovação entre os deputados.
Para Carlos Fara, o governo poderá ver a lei ser ainda mais desidratada
pelos senadores.
– Milei também pode encontrar uma dor de cabeça no Senado, que pode
querer fazer modificações, o que significa que a lei teria que voltar para a
Câmara dos Deputados, resultando em perda de tempo para o governo e, ao perder
tempo, ele obviamente perde poder – concluiu.
PRESSÃO PELA VOTAÇÃO
Mais cedo, na reta final dos debates, Javier Milei pressionou pela votação e
disse que os deputados têm a oportunidade de mostrar em que lado da história
querem ficar.
– O governo escutou as posições das diferentes forças políticas e exige
responsabilidade e celeridade na votação – afirma a nota do gabinete
compartilhada por Milei no X (antigo Twitter).
– O tempo para o debate acabou. É hora de os representantes do povo
decidirem se estão do lado da liberdade dos argentinos ou do lado dos
privilégios da casta e da república corporativa.
– O governo anterior deixou um país devastado. Um em cada quatro
argentinos é pobre. Seis em cada dez crianças não comem todos os dias. É
evidente que o sistema anterior fracassou e o poder Executivo requisita com
urgência as ferramentas para reformar a economia – acrescenta.
*AE