O dado sobre o ritmo de aprendizagem das crianças antes, durante e depois da pandemia mostra ainda que aquelas que frequentaram o segundo ano da pré-escola em 2022, com a volta das atividades presenciais, tiveram ganho de 1 a 2 meses, na comparação com os alunos do mesmo perĂodo letivo em 2019.
As informações são do estudo Recomposição das aprendizagens e desigualdades educacionais após a pandemia covid-19: um estudo em Sobral/CE, produzido por pesquisadores do Laboratório de Pesquisa em Oportunidades Educacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LaPOpE).Embora os dois grupos de crianças (2020 e 2022) tenham vivido ao menos parte da pré-escola com ensino remoto, os resultados sugerem que as ações realizadas pela rede de ensino para mitigar os impactos da pandemia surtiram efeito nas crianças que concluĂram a etapa em 2022.
Apoiada pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, a pesquisa estimou os efeitos da pandemia no curto e médio prazo e traz evidĂȘncias inéditas sobre a recuperação do aprendizado, com destaque para a qualidade da educação ofertada.
Para chegar aos resultados, o estudo acompanhou o desenvolvimento de 1.364 crianças matriculadas na rede pĂșblica municipal de Sobral (CE), que frequentaram o segundo ano da pré-escola entre 2019 e 2022.
A pesquisa observou que o grupo de crianças que vivenciou o segundo ano da pré-escola em 2020 – com maior perĂodo remotamente – aprendeu o equivalente a 39% em linguagem e 48% em matemĂĄtica, se comparado àquele que frequentou esta etapa em 2019, de modo presencial. JĂĄ o grupo que terminou a pré-escola em 2022 aprendeu o equivalente a 111% em linguagem e 115% em matemĂĄtica, na comparação com o grupo que frequentou o segundo ano da etapa em 2019.
De acordo com os pesquisadores, os resultados mostram os efeitos da reabertura das escolas sobre os ritmos de aprendizagem. As crianças do grupo de 2020, por exemplo, que vivenciaram o primeiro ano da pré-escola presencialmente, sofreram com a interrupção das atividades presenciais e a oferta remota na conclusão da etapa educacional.
Segundo Mariane Koslinski, pesquisadora do LaPOpE e uma das responsĂĄveis pelo estudo, as incertezas da pandemia, as interrupções nas atividades, presenciais ou não, e todo o perĂodo de adaptação ao modelo remoto impactaram diretamente no ritmo de aprendizagem dessas crianças, que tiveram aprendizagem aquém daquelas que concluĂram a etapa em 2019.
A pesquisadora destacou, no entanto, que a recuperação do ritmo de aprendizagem das crianças que concluĂram a educação infantil em 2022 chama ainda mais atenção. "É curioso porque, como as crianças do grupo de 2020, as do ano passado também viveram parte da etapa no regime remoto", disse Mariane, em nota.
"O que os resultados indicam é que, provavelmente, as ações da rede de educação de Sobral foram importantes para mitigar os efeitos da pandemia e acelerar o ritmo de desenvolvimento dessas crianças", completou.
Entre as ações, a pesquisadora destacou programas de busca ativa, ampliação da oferta de tempo integral e a implementação de novo currĂculo para a Educação Infantil alinhado àBase Nacional Comum Curricular (BNCC).
Os pesquisadores reforçam ainda que os resultados do estudo não devem ser interpretados como um retrato do que aconteceu no resto do paĂs. "A ausĂȘncia de coordenação nacional nos anos de pandemia gerou um cenĂĄrio extremamente desafiador para os gestores municipais e as respostas para os desafios da pandemia foram muito desiguais e inconsistentes quando comparamos estados e municĂpios pelo paĂs".
Para a gerente de Conhecimento Aplicado e especialista em educação infantil da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, Beatriz Abuchaim, o desafio neste momento ultrapassa as esferas educacionais. "Diversas evidĂȘncias mostram que a pandemia afetou desigualmente as famĂlias em questão de renda, acesso a serviços e a redes de apoio. Tudo isso trouxe impactos para o desenvolvimento e aprendizagem das crianças", afirmou Beatriz, em nota.
"Nesse sentido, as ações devem ser integradas e contemplar diversas esferas e nĂveis de governo. A responsabilidade por montar essa estratégia não pode ser só da ĂĄrea de educação", acrescentou.
Os pesquisadores apresentam uma série de recomendações para os gestores de diferentes nĂveis a fim de mitigar os problemas apontados. Para o Ministério da Educação é recomendado que haja um protagonismo na elaboração de um plano nacional de recuperação de aprendizagem com aporte de recursos e apoio técnico para guiar as ações das secretarias estaduais e municipais de educação.
JĂĄ as secretarias estaduais de educação devem, entre outros pontos, oferecer apoio técnico e financeiro para que os municĂpios elaborem e implementem suas estratégias. As secretarias municipais de educação, por sua vez, devem implementar programas de busca ativa de crianças com foco na educação infantil e elaborar diagnósticos sobre os efeitos da pandemia no desenvolvimento das crianças e nas taxas de abandono e evasão escolar.
Os diretores e professores podem promover maior integração entre famĂlias e escolas incorporando estratégias bem-sucedidas de comunicação com famĂlias utilizadas durante a pandemia.
Fonte: AgĂȘncia Brasil