Emendas "Pix" dos senadores Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) e Randolfe Rodrigues (PT-AP)que somam R$ 3 milhões beneficiaram uma ONG do AmapĂĄ que entrou no foco da CGU (Controladoria-Geral da União) sob suspeita de sobrepreço e de falta de transparĂȘncia e de critérios para a sua escolha.
A entidade promoveu festivais em cidades do estado divulgados pelos dois parlamentares desde o ano passado. Também foi verificado pela Controladoria que a instituição não tinha capacidade técnica para executar os serviços.
Os recursos foram repassados à Prefeitura de Santana (AP) e ao governo do estado e, por estes, ao Inorte (Instituto de Gestão em Desenvolvimento Social e Urbano). Os senadores negam conhecer a ONG e afirmam que repassaram as verbas às administrações pĂșblicas, sem direcionamento.
A Inorte, quando foi aberta em 2005 e antes de fazer estes festivais, funcionava como associação de empreendedores evangélicos e prestava serviços de assistĂȘncia a crianças e adolescentes.
Em 2021, o CNPJ passou por uma reformulação, ganhou novos nomes, donos, endereço e funções. Hoje, a instituição lista 20 atividades econômicas no seu cadastro na Receita Federal, como o comércio varejista de livros, produção de filmes para publicidade, produção cinematogrĂĄfica e aluguel de equipamentos recreativos e esportivos, palcos e coberturas.
A CGU identificou irregularidades na execução de cerca de R$ 850 mil em emendas de Randolfe pela Inorte. As verbas foram repassadas ao Governo do AmapĂĄ para realizar, neste ano, o 79Âș aniversĂĄrio da cidade de Oiapoque e a Festa de São Tiago, no municĂpio de Mazagão. O governador Clécio LuĂs (Solidariedade) é aliado de Randolfe e tem defendido o uso de emendas parlamentares.
Segundo a Controladoria, a seleção da ONG, feita sem chamamento pĂșblico e concorrĂȘncia, foi irregular, jĂĄ que outras instituições poderiam realizar o mesmo serviço.
A Controladoria também afirmou que a ONG terceirizou todas suas entregas no evento e que uma das empresas subcontratadas pertence ao diretor financeiro da instituição.
Além disso, o escritório que prestou serviços de advocacia à ONG foi aberto com o nĂșmero de telefone da entidade e é de uma advogada que jĂĄ prestava serviços a ela.
A CGU identificou 194% de sobrepreço na contratação de serviços de conteĂșdo intelectual, com "expressivas variações" em serviços jurĂdicos e gestão do projeto e plano de trabalho.
De acordo com a Controladoria, os achados representam um grande risco de lesão ao erĂĄrio, uma vez que as empresas contratadas tĂȘm elos com pessoas que possuem vĂnculos profissionais com a Inorte.
Nos perfis em redes sociais da Inorte, hĂĄ vĂdeo com entrevista, fotos e o nome de Randolfe divulgado em publicações sobre esses eventos. Ele também posou em uma foto com funcionĂĄrios da ONG em visita ao Congresso Nacional, em BrasĂlia, em setembro do ano passado.
Por meio de sua assessoria, o senador reafirmou que não tem relação com o Instituto Inorte, que as festas mencionadas são pĂșblicas e que é de conhecimento geral que participa de uma série de eventos pĂșblicos e tira fotos diversas com as pessoas.
Randolfe também disse que a CGU não indicou ilĂcitos na execução de emendas apontados especificamente ao seu gabinete e sim fatos relacionados à gestão de recursos do estado e municĂpios e da organização não governamental.
No final do ano passado, a Inorte também recebeu R$ 1,2 milhão da Prefeitura de Santana, com recursos da emendas de Alcolumbre para realizar o evento "Viva Santana 2023". O evento ocorreu entre novembro e dezembro, com apresentação gospel, coral, evento gastronômico e feira tecnológica.
Em anĂĄlise, a CGU apontou que o municĂpio não cumpriu o prazo para que instituições interessadas em executar o projeto pudessem apresentar as suas propostas, o que prejudicou a competição, e que a Inorte forneceu a sua prestação de contas do evento de forma incompleta.
O mesmo foi dito na execução de outra emenda de Alcolumbre de cerca de R$ 1 milhão para a Inorte executar o festival de verão da cidade.
O senador disse, por meio de sua assessoria, que conforme estabelecido pela Constituição, "nunca destinou emenda de transferĂȘncia especial para institutos ou ONGs" e sim para o Governo do AmapĂĄ ou para prefeituras, conforme previsto na legislação.
Também disse que os municĂpios e o governo beneficiados por essas emendas são responsĂĄveis legalmente por informar sobre a gestão dos recursos.
JĂĄ o Inorte respondeu, por meio do advogado HercĂlio Aquino, que a região amazônica, onde o AmapĂĄ se situa, apresenta desafios logĂsticos e operacionais que impactam diretamente nos custos das contratações, especialmente na ĂĄrea cultural.
Além disso, afirmou que todas as metas estabelecidas foram exaustivamente comprovadas em relatório final no processo e que a contratação de diretores ou pessoas ligadas ao quadro superior da organização "se torna necessĂĄria para suprir a demanda operacional, sem a necessidade de ampliar o quadro com novos colaboradores externos".
A Prefeitura de Santana disse que todas as entidades foram selecionadas por chamada pĂșblica amplamente divulgada e que os recursos são aplicados de acordo com o planejamento elaborado pela gestão. O Governo do AmapĂĄ não respondeu aos questionamentos da reportagem.
Fonte: agoranoticiasbrasil.com.br/