A juíza Fabiana Alves Rodrigues, da 8ª Vara
Criminal Federal de São Paulo, autorizou a Polícia Federal (PF) a levar adiante
o inquérito sobre a máfia das creches em que o prefeito Ricardo Nunes (MDB) é
investigado sob a suspeita de receber pagamentos indevidos de uma entidade que
mantinha contrato com o Município. Ao mesmo tempo, a magistrada negou o pedido
da defesa que pretendia o arquivamento do inquérito.
Agora os federais poderão
executar diligências para esclarecer operações suspeitas mantidas pela ACRIA
(Associação Amiga da Criança e do Adolescente) e que supostamente envolvem
Nunes, bem como para apurar o suposto crime de lavagem de dinheiro imputado a
outro acusado no caso.
– Caberá à autoridade policial
extrair as cópias dos documentos que entender necessários para instauração dos
novos inquéritos – escreveu a juíza.
A defesa do prefeito havia
pedido o arquivamento sumário do inquérito e o trancamento da investigação
sobre Nunes. Ela alegava que o inquérito policial foi instaurado em 4 de junho
de 2019, há mais de cinco anos, "não tendo sido apurados indícios de condutas
ilícitas em relação" a Nunes. A decisão da PF havia sido tomada em agosto, dois
meses antes do primeiro turno das eleições.
Além disso, a defesa alegava
que o pedido de "desmembramento do feito para continuidade das investigações"
tinha "caráter político e eleitoreiro", o que configuraria a hipótese de
""fishing expedition", vitaminado pelo período eleitoral". Por fim, os
advogados de Nunes diziam que a representação da autoridade policial não
apresentava "as justificativas para o desmembramento do feito e continuidade
das investigações" tampouco indicava quais os objetivos ou diligências deveriam
ser feitas.
A Polícia Federal havia alegado
à magistrada que inúmeras diligências realizadas durante a investigação e o
indiciamento de 116 investigados demonstravam a magnitude e a complexidade da
investigação, daí a razão da demora . De acordo com a PF, o "pedido de
desmembramento do feito é a melhor estratégia investigativa, tendo em vista a
quantidade de fatos já investigados e comprovados nos autos principais e para
evitar atraso na continuidade da persecução penal em relação aos demais
investigados".
Com relação a Nunes, o delegado
afirmou à juíza que "não foram apresentados documentos que comprovem a prestação
de serviços ou emissão de notas fiscais em relação ao valor de R$ 31.590,16 no
dia 27 de fevereiro de 2018 da empresa noteira Francisca Jaqueline Oliveira
Braz Eireli. Além disso, a investigada Rosângela Crepaldi dos Santos teria
gravado um vídeo em que afirma que as empresas de Nunes teriam recebido
dinheiro das creches sem terem prestado quaisquer serviços. Mais tarde,
Rosângela se retratou.
Por último, os federais
afirmaram que era dispensável que a autoridade policial indicasse as possíveis
diligências a serem realizadas no pedido de instauração de novo inquérito
policial bem como que o pedido de desmembramento da investigação também foi
motivado pela possível necessidade de quebra do sigilo bancário e fiscal das
principais pessoas físicas e jurídicas envolvidas, "medida sabidamente
demorada".
O Ministério Público Federal
(MPF) concordou com o pedido da PF e pediu a instauração de um inquérito
policial sigiloso. Para a procuradoria, "torna-se necessária a instauração de
novo inquérito policial para esclarecer os fatos suspeitos apurados ao longo
das investigações, razão pela qual eventual pedido de arquivamento somente
poderia ser analisado quando finalizada a nova investigação".
Na primeira fase do inquérito,
a indiciada Elaine Targino da Silva, além de presidente da ACRIA, teria sido
registrada como empregada da empresa Nikkey Serviços, na qual figuram como
sócias Regina Nunes e Mayara Nunes, mulher e filha do prefeito. De acordo com a
PF, a remessa de R$ 31.590,16 da empresa investigada Francisca Jacqueline
Oliveira para conta de Nunes foi feita por meio de dois cheques de R$ 5.796,08
(cinco mil, setecentos e noventa e seis reais e oito centavos) e de um TED de
R$ 20 mil para a Nikkey Serviços.
Ao todo, a ACRIA movimentou,
segundo a PF, R$ 162 milhões. E recebeu R$ 49,8 milhões da Prefeitura. Quando
era vereador, Nunes empregaria em seu gabinete na Câmara Municipal uma parente
de três diretoras da ACRIA.
– O contexto apurado sugere que
os fatos supostamente ilícitos envolvendo a ACRIA podem de fato ter contado com
a participação do requerente Ricardo Nunes – escreveu a magistrada.
Ao depor, o prefeito disse que
nunca foi sócio da Nikkey Serviços, porém, "sempre coordenou os trabalhos,
apesar da empresa estar em nome da esposa e da filha do declarante". Nunes
afirmou que os pagamentos da ACRIA se referiam a uma prestação de serviço. E
disse que vai entregar documentos "comprovando esse fato".
RICARDO
NUNES SE MANIFESTA SOBRE O CASO:
O prefeito Ricardo Nunes reitera que nada se comprovou contra ele numa investigação
de cerca de cinco anos. Concluída em agosto deste ano, a apuração da Polícia
Federal sequer incluiu o nome do prefeito entre os 116 indiciados. Portanto, é
de se estranhar tal decisão num processo em que o prefeito já prestou todos os
esclarecimentos às autoridades. Por fim, reitera que não há nenhuma relação
dele ou de sua empresa com a empresa envolvida em suposto ilícito.
*AE