Dados da Sociedade Brasileira de Queimaduras (SBQ) indicam que, no Brasil, é registrado anualmente cerca de 1 milhão de pessoas com queimaduras, das quais 100 mil procuram atendimento médico. As crianças e idosos são a parcela da população mais vulnerĂĄvel. A maioria dos acidentes (70%) ocorre dentro de casa.
Em razão do Dia Nacional de Luta contra Queimaduras, lembrado nesta terça-feira (6) - e instituĂdo pela Lei 12.026/2009 -, a SBQ promove anualmente a campanha Junho Laranja. O objetivo é alertar a população e as autoridades sobre os riscos de acidentes com queimaduras e os traumas que podem causar. Este ano, as queimaduras elétricas são o tema central da campanha. A iniciativa tem o poio da Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade (Abracopel).O tema foi escolhido após a divulgação dos dados do Boletim Epidemiológico n° 47, do Ministério da SaĂșde, de dezembro de 2022, que indicou à SBQ a necessidade de medidas incisivas para a redução das taxas de acidentes elétricos. No perĂodo de 2015 a 2020, ocorreram no Brasil 19.772 óbitos por queimaduras, sendo que a eletricidade respondeu por 9.117 (46,1% do total). A campanha da SBQ alerta que a eletricidade tem potencial de causar morte imediata no momento do trauma, correspondendo a 70% desses óbitos, e pode levar a sequelas importantes, incluindo grandes amputações.
Em entrevista à AgĂȘncia Brasil, a médica Kelly Danielle de AraĂșjo, vice-presidente da SBQ, informou que boa parte das vĂtimas de queimaduras elétricas é formada por homens em idade produtiva, de 19 a 59 anos e, em maior nĂșmero, na construção civil informal. Acrescentou que, no Brasil, onde as pessoas tĂȘm o hĂĄbito de fazer suas próprias construções, puxadinhos, reparos em casa, isso pode ter gravidade e levar ao óbito imediatamente. "E se vocĂȘ tem uma casa em que a fiação elétrica estĂĄ inadequada, o risco é para todo mundo". Isso inclui crianças, idosos, donas de casas e animais. "Porque pode acontecer um curto-circuito, eles podem encostar em alguma fiação inadequada e se queimar. Pode haver um incĂȘndio na casa". Com aparelhos eletrodomésticos que não estejam em boas condições, isso também pode ocorrer, lembrou.
Apesar de ter como tema central a prevenção de queimaduras elétricas, a campanha do Junho Laranja vai abordar também outros tipos de acidentes com queimaduras e serĂĄ realizada no formato hĂbrido, envolvendo ainda ações presenciais, como iluminação de monumentos na cor laranja, atividades de orientação à comunidade e palestras e capacitações nos centros de Tratamento de Queimados para profissionais da saĂșde e pacientes. A campanha da SBQ serĂĄ lançada nesta terça-feira (6), às 19h, durante a live "Os riscos de queimadura de origem elétrica - SBQ x Abracopel", que pode ser acessada no youtube.
A vice-presidente da SBQ confirmou que ocorre grande incidĂȘncia de queimaduras nesta época do ano. Destacou a importância da campanha porque, depois de queimada, a pessoa vai ter que lidar com trauma psicológico, sequelas, além do risco de amputação de membros e óbito. "O ideal, realmente, é a prevenção. Então, o melhor é não queimar". Nos paĂses desenvolvidos, não é comum o registro de queimaduras. Segundo Kelly, 95% das queimaduras registradas no mundo ocorrem em paĂses em desenvolvimento e subdesenvolvidos. "Só 5% acontecem em paĂses desenvolvidos". Ela reforçou que onde existe o hĂĄbito de investir em prevenção e orientar a população, hĂĄ menos queimaduras.
A Sociedade Brasileira de Cirurgia da Mão (SBCM) chama a atenção para o fato de que, no mĂȘs em que ocorrem as festas juninas, a incidĂȘncia de acidentes com queimaduras tem destaque em função do uso de fogos de artifĂcio. O diretor da entidade, Sérgio Augusto Machado da Gama, disse que as queimaduras são muito frequentes em adultos jovens e crianças, e que as mãos são os membros mais afetados diretamente pelos fogos de artifĂcio.
"Elas (as mãos) estão muito expostas, não só a queimaduras, mas a traumas. Por isso, a gente tem sempre uma preocupação muito grande com as mãos e em queimaduras nas mãos, porque hĂĄ vĂĄrios graus com diferentes extensões". Ele destacou que as queimaduras de primeiro grau nas mãos apresentam vermelhidão, ardor, e são mais superficiais. "O problema maior para os cirurgiões de mão é o das queimaduras mais profundas, de terceiro grau, em que, às vezes, a pessoa tem comprometimento de tendão, de nervo, de osso. São nessas queimaduras mais profundas que vocĂȘ acaba precisando de um cirurgião de mão. São as lesões que a gente chama de terceiro grau".
Essas queimaduras podem resultar em sequelas importantes. Muitas vezes, as lesões evoluem com a morte de tecidos que precisam ser retirados, em função de necroses. "Muitas vezes, essas lesões precisam de cobertura. Um cirurgião de mão estĂĄ preparado para colocar enxertos de pele ou retalhos de pele nesses pacientes". Também essas lesões podem levar à contratura de dedos, perda do movimento de dedos e punho.
Gama lembrou que não se trata somente das queimaduras térmicas. Da mesma maneira, não se pode esquecer das queimaduras elétricas, que "são extremamente graves", e das queimaduras quĂmicas. "A gente tem que estar sempre muito atento a isso". Recomendou que as pessoas não devem colocar sobre lesões provocadas por queimaduras materiais como pasta de dentes, manteiga, óleo, clara de ovo. "É importante esse esclarecimento". JĂĄ uma queimadura mais superficial pode ser resfriada, lavada em ĂĄgua corrente por alguns minutos. Outra dica, quando a queimadura evolui para um edema, é retirar todos os adornos, como relógio, anéis, aliança, pulseiras. A principal recomendação é trabalhar na prevenção e na conscientização de todos, orientou o diretor da SBCM.
As queimaduras em ambiente doméstico também são muito comuns, principalmente envolvendo crianças. Por isso, não se deve deixar panelas expostas ou ao alcance de crianças no fogão. Os cabos devem estar sempre virados para dentro. As mães ou responsĂĄveis não devem segurar panelas ou objetos quentes quando vão abordar os menores. As crianças devem ser mantidas longe da cozinha e do fogão, principalmente durante o preparo das refeições. Cuidados devem ser tomados da mesma forma com relação à tampa do forno e a churrasqueiras. "Na festa junina, mais ainda. A gente vĂȘ muita queimadura exposta".
O diretor da SBCM destacou a gravidade das queimaduras elétricas que podem resultar, inclusive, na amputação de dedos e, até, da mão. Sugeriu que ao colocar bandeirolas para enfeitar as festas juninas, se evite colocĂĄ-las próximo a redes elétricas. "A gente vĂȘ muito também queimaduras por ĂĄlcool, ao acender fogueiras de São João, que podem resultar em explosões".
A queimadura tem vĂĄrios graus. A de primeiro grau, também chamada superficial, é aquela que envolve apenas a epiderme, a camada mais superficial da pele. Os sintomas são intensa dor e vermelhidão local, mas com palidez na pele quando se toca. A lesão desse tipo de é seca, não produz bolhas e, em geral, melhora no intervalo de 3 a 6 dias, podendo descamar. Não deixa sequelas.
As queimaduras de segundo grau são divididas em superficial e profunda. A superficial envolve a epiderme e a porção mais superficial da derme. Inclui o aparecimento de bolhas e uma aparĂȘncia Ășmida da lesão. A cura é mais demorada, podendo levar até trĂȘs semanas. Ela não costuma deixar cicatriz, mas o local da lesão pode ser mais claro. JĂĄ as de segundo grau profundas são aquelas que acometem toda a derme, sendo semelhantes às de terceiro grau. Como hĂĄ risco de destruição das terminações nervosas da pele, esse tipo de queimadura, que é bem mais grave, pode até ser menos doloroso que as mais superficiais. As glândulas sudorĂparas e os folĂculos capilares também podem ser destruĂdos, fazendo com que a pele fique seca e perca seus pelos. A cicatrização demora mais que trĂȘs semanas e costuma deixas marcas.
JĂĄ as queimaduras de terceiro grau são profundas e acometem toda a derme, atingindo tecidos subcutâneos, com destruição total de nervos, folĂculos pilosos, glândulas sudorĂparas e capilares sanguĂneos, podendo, inclusive, atingir mĂșsculos e estruturas ósseas. São lesões esbranquiçadas, acinzentadas, secas, indolores e deformantes, que não curam sem o apoio cirĂșrgico, necessitando de enxertos.
Fonte: AgĂȘncia Brasil