BRASÍLIA – Policiais civis goianos
prenderam em Brasília, nesta segunda-feira (3), Carlos César Savastano Toledo,
conhecido como Cacai Toledo. Ele era presidente do União Brasil no Estado e
estava foragido havia sete meses, após ser apontado como um dos responsáveis pela
morte do empresário Fábio Alves Escobar Cavalcante, executado em 23 de junho de
2021 por vingança, após ter denunciado desvios de dinheiro na campanha
eleitoral de 2018, segundo a investigação.
Cacai foi coordenador da campanha política do antigo Democratas
(atual União Brasil) ao governo de Goiás de 2018. Com a vitória do então
senador Ronaldo Caiado (União Brasil), ele ganhou o cargo de diretor
administrativo da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Goiás (Codego). Em
2020, foi preso por suspeita de fraudes em licitações na companhia e perdeu o
cargo.
Outro acusado de envolvimento no assassinato de Fábio Escobar é
Jorge Caiado, primo de Ronaldo Caiado. Assim como Cacai, ele virou réu pelo
assassinato do empresário, que resultou nas execuções de outras sete pessoas
para esconder evidências da morte dele – entre eles, uma mulher grávida de 7
meses. Doze policiais militares goianos são acusados de envolvimento nos
crimes.
O plano que acabou em assassinatos em série, de acordo com
investigação do Ministério Público de Goiás (MPGO), foram as denúncias de
corrupção feitas por Fábio Escobar contra Cacai Toledo. Em março, o MPGO
denunciou Jorge Caiado, que é assessor da Assembleia Legislativa (Alego). Três
juízes acataram a denúncia por entender que há evidências suficientes. Os
magistrados determinaram a citação dos réus, dando 10 dias para a resposta às
acusações.
Cacai Toledo estava foragido desde novembro, quando houve uma
operação para prender suspeitos de participação no homicídio. Em dezembro, ele
foi denunciado pelo MPGO à Justiça pelo homicídio. A Justiça acatou. A defesa
de Cacai divulgou nota nesta terça-feira (4) alegando que o cliente só não se
entregou antes porque não tinha garantia de vida.
"A defesa informa que estava em tratativas com as autoridades
competentes para apresentar Carlos César Savastano de Toledo, cuja única
exigência sempre foi de que sua vida seja protegida. Ele teme, com razão, os
verdadeiros mandantes do crime praticado contra Fábio Escobar. Agora, com o
cumprimento do mandado de prisão, confia que sua integridade seja preservada
pelas forças de segurança pública, Ministério Público e Poder Judiciário", diz
a nota.
Segundo a investigação do MPGO, Cacai foi o mentor da morte de
Escobar. Já PMs respondem por essa execução e pelas outras 7, que serviriam
para encobrir o assassinato de Escobar. Em março, o MPGO incluiu Jorge Caiado
como um dos denunciados, por ter "incentivado" e "prestado auxílio" na execução
do plano que levou à morte de Escobar.
Então presidente do partido Democratas (atual União Brasil) de
Anápolis – distante 55km de Goiânia, é a mais rica e terceira mais populosa
cidade de Goiás –, Cacai coordenou a vitoriosa campanha política de Ronaldo
Caiado em 2018. Escobar trabalhou ao lado de Cacai nessa vitoriosa campanha.
Reeleito em 2022, Caiado é um dos nomes cotados para concorrer à
Presidência da República em 2026, como opção da direita na ausência de Jair
Bolsonaro (PL), tornado inelegível. Ronaldo Caiado tem o nome citado no
inquérito, mas não é alvo de investigação. Também não fez qualquer declaração
sobre as acusações contra o primo e um ex-integrante do seu governo.
Já Cacai e Escobar viraram inimigos. O empresário, que viria a ser
assassinado, também passou a criticar a gestão de Ronaldo Caiado, por meio das
redes sociais. "Caiado despreza as pessoas sem estudo. Nem todo mundo é filho
de fazendeiro e tem oportunidade de fazer faculdade de medicina", disse em uma
das suas publicações. Caiado é formado em medicina e integra uma tradicional
família de fazendeiros de Goiás.
Contra Cacai, Escobar foi mais longe. Também pelas redes sociais,
passou a denunciar o coordenador da campanha de Caiado em Anápolis por supostos
desvios de dinheiro. Em vídeo publicado na internet, Escobar mostrava o momento
em que devolvia R$ 150 mil, que ele dizia ter recebido de Cacai como suborno
para interromper as denúncias.
"Eu recebi uma tentativa de suborno. Através de um intermediário,
de um empresário, R$ 150 mil. E a pessoa que veio me entregar o dinheiro é mais
ou menos assim, ou pega ou morre. Pois bem, logo que ele me entregou esse
dinheiro eu fui lá no escritório desse empresário, devolvi os 150 mil [reais],
gravei, esse vídeo vai para o amanhã e dia primeiro vou entregar para o
promotor. E aí a Justiça vai mostrar quem que é o vilão e quem que é a vítima.
[
] Eu tenho Deus na minha vida, tenho dois filhos para criar, mas não vou
ficar calado com medo de morrer, porque Deus sabe a hora de todo mundo",
afirmou Escobar.
Relatório final do MPGO sobre o caso traz uma troca de mensagens
entre Escobar e o governador Ronaldo Caiado, por meio de Whatsapp. No diálogo,
o empresário disse ao governador que iria apagar as denúncias contra Cacai de
suas redes sociais porque temia por sua vida e de sua família.
Escobar publicou um vídeo em rede social dizendo que havia tentado
se encontrar pessoalmente com Caiado para detalhar a denúncia. "Eu só tenho uma
questão aqui. Governador, o senhor não me recebeu, não quis me escutar, sabendo
que eu fiz parte do projeto do DEM, seis anos, acreditando no seu governo.
Governo esse que até agora não mostrou a que veio, independente de pandemia ou
não", afirmou o empresário.
Escobar tinha 38 anos quando foi morto em uma emboscada na noite
de 23 de junho de 2021. Ele havia tomado um táxi para se encontrar com um homem
chamado "Fernando" que havia entrado em contato com ele supostamente
interessado em vender uma lavanderia no bairro Jamil Miguel, em Anápolis.
Escobar, que trabalhava no ramo de lavanderias, contou ao taxista que queria
vistoriar o imóvel. Mas o tal Fernando nunca apareceu. Assim que deixou o táxi,
Escobar levou quatro tiros disparados por dois homens que saíram de um Fiat Uno
com os rostos cobertos por balaclavas. O empresário ainda foi socorrido pelo
taxista, mas morreu logo que chegou ao hospital.
O MP de Goiás acusa Jorge Caiado de usar sua influência na
Secretaria de Segurança do Goiás para ajudar no planejamento do assassinato.
"O denunciado Jorge Luiz Ramos Caiado, agindo livre e
conscientemente, em comunhão de ações e desígnios com o executor do crime e com
os demais denunciados, aderindo previamente à intenção homicida, concorreu de
forma eficaz para o crime de homicídio contra a vítima Fábio Alves Escobar
Cavalcante, eis que prestou apoio moral ao mentor Carlos César Savastano de
Toledo, incentivando e reforçando os seus planos de matar a vítima", diz a
denúncia.
Conforme a denúncia do MPGO, Jorge Caiado apresentou Cacai ao
policial militar Welton da Silva Veiga, apontado como chefe de um grupo de
extermínio formado por PMs goianos. Veiga aceitou comandar o crime e cooptou os
também policiais militares Thiago Marcelino Machado, Glauko Olívio de Oliveira
e Érick Pereira da Silva para auxiliá-lo no assassinato de Escobar, ainda
segundo o MPGO.
"Ressalte-se que se não fosse o traquejo de Jorge Caiado e
influência com autoridades policiais, Carlos Toledo, por si só, não teria
atingido seu desiderato criminoso", frisam os promotores que assinam a denúncia
do episódio que ficou conhecido como Caso Escobar.
Em dezembro, dois oficiais da PM de Goiás, contaram, em depoimento
ao MP, que haviam sido procurados por Jorge Caiado com pedido para matar Fábio
Escobar. Ambos garantiram ter rechaçado a proposta. Um deles havia sido chefe
da Casa Militar na administração de Ronaldo Caiado.
Já os 12 policiais militares acusados de envolvimento nos
assassinatos do Caso Escobar acabaram promovidos por "atos de bravura", com
medalhas, por participaram de confrontos com supostos bandidos. No entanto,
segundo o MP, tais confrontos foram execuções para queima de arquivo, com
simulações que incluíram alterações das cenas dos crimes, com armas
"plantadas".
Cacai foi preso em 2020 na Operação Negociatas, por suspeita de
fraude na Codego, em que ele comandava na gestão de Ronaldo Caiado. Na ocasião,
policiais apreenderam o celular dele. Peritos recuperaram mensagens com pedidos
para policiais "perseguirem, grampearem e espancarem" Fábio Escobar.
Promotores de Justiça que cuidaram do caso dizem que tudo foi
meticulosamente pensado para dificultar a investigação. Cacai e Jorge Caiado
não são citados como envolvidos na morte das outras sete pessoas, assassinadas
para esconder provas. Em muitos casos, PMs simularam confrontos para justificar
as mortes das vítimas, que teriam testemunhado a execução de Escobar ou tinham
informações sobre o caso.
Além de Escobar, também foram assassinados: Bruna Vitória Rabelo,
Gabriel Santos Vital, Gustavo Lage Santana, Mikael Garcia de Faria, Bruno
Chendes, Edivaldo Alves da Luz Daniel Douglas de Oliveira.
Durante a investigação da Polícia Civil sobre o Caso Escobar,
agentes usaram a quebra de sigilo bancário e telefônico para corroborar as
provas de envolvimento dos policiais militares denunciados. eles identificaram
movimentações bancárias incompatíveis com os rendimentos da Polícia Militar.
O policial militar Marcos Jesus Rodrigues movimentou cerca de R$ 6
milhões em 4 anos. Já Almir Tomás de Aquino Moura, também PM, movimentou R$ 5,8
milhões. As informações constam no relatório final do MP de Goiás que resultou
na denúncia à Justiça.
Fonte: O Tempo