São Paulo — Associações sem fins lucrativos acusadas de aplicar descontos
indevidos em aposentadorias respondem a 62 mil processos judiciais em todo o
Brasil. A "farra do desconto" praticada por essas entidades, que arrecadou mais
de R$ 2 bilhões desde janeiro de 2023, vem sendo denunciada pelo Metrópoles
desde dezembro.
Dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação mostram que
existem, atualmente, 29 associações no país autorizadas pelo Instituto Nacional
do Seguro Social (INSS) a praticar o chamado "desconto de mensalidade associativa"
nos benefícios de aposentadoria e pensão. A contribuição é feita em troca de
supostos serviços oferecidos aos associados, como assistência em saúde.
Desde janeiro do ano passado, o número de filiados explodiu, assim
como o faturamento mensal dessas associações, que saltou de R$ 85 milhões, no
início de 2023, para R$ 250 milhões atualmente.
O problema é que dezenas de milhares de aposentados dizem ter sido
filiados a essas entidades sem autorização, o que é ilegal, e se veem obrigados
a acionar a Justiça para conseguir reaver o dinheiro descontado indevidamente.
Uma delas é a aposentada Nilcea Maria dos Santos (imagem abaixo),
de 69 anos, vítima do golpe duas vezes em um ano. Ela conta que, logo após
vencer um processo judicial contra uma associação que fez desconto indevido de
uma contribuição diretamente na folha de pagamento do seu benefício, em outubro
do ano passado, descobriu que outra entidade também passou a realizar os
descontos.
Nilcea está processando a segunda associação e o caso ainda
tramita na Justiça. "Como pode chegar dentro do INSS e impor um desconto que
não foi combinado, com uma empresa totalmente desconhecida? Eu não conheço
benefício algum e fui descontada", diz Nilcea.
Grande parte das pessoas prejudicadas por essas entidades são
pobres, moradores de periferias e com baixo grau de escolaridade. São as que
mais dependem do dinheiro da aposentadoria e recebem o piso do INSS,
equivalente a R$ 1,4 mil mensais.
Há casos nos quais fraudes em assinaturas e abordagens predatórias
ficaram comprovadas pela Justiça em duras sentenças que aplicam às associações
multas por danos morais.
O Metrópoles questionou o INSS sobre os descontos indevidos feitos
por entidades e sobre o aumento das parcerias e reclamações contra elas. O
órgão não se manifestou.
Em dezembro, o INSS afirmou apenas que "mantém acordos de
cooperação técnica com entidades de classe para desconto de mensalidade
associativa com algumas instituições", com base na Lei nº 8.213/1992 e no
Decreto nº 3.048/1999.
Após a série de reportagens do Metrópoles, o ministro da
Previdência, Carlos Lupi (PDT), afirmou, nessa quarta-feira (27/3), que a pasta
está "agindo firme" para "coibir abusos" e "fraudes" nos descontos feitos
diretamente da folha de pagamento dos aposentados.
"Fizemos, recentemente, uma portaria que coíbe essas fraudes, cria
obrigatoriedade de autorização reconhecida e com biometria do segurado, o que
facilita o cancelamento [da contribuição] de quem quiser, a qualquer momento",
disse Lupi ao Metrópoles.
A portaria à qual o ministro se refere foi publicada no dia 15 de
março. Diante da explosão de reclamações de aposentados, a pasta endureceu
regras para punir associações que têm cometido fraudes contra aposentados por
meio de descontos indevidos, sem anuência dos segurados.
Entre os dispositivos, está a possibilidade de suspensão imediata
do termo firmado pelo INSS com essas entidades e penas mais duras para o caso
de fraudes comprovadas em processos administrativos conduzidos para apurar as
denúncias.
Fonte: agoranoticiasbrasil.com.br