São Paulo — Historicamente cobiçado pelo mundo político por conta da sua
função estratégica e da receita que ultrapassa a cifra de R$ 1 bilhão ao ano, o
Porto de Santos abriu as portas para o loteamento de cargos na sua cúpula —
diretores, superintendentes e gerentes — no governo do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva (PT).
Ex-assessores, parentes de políticos petista e até da oposição, ex-sócio
e irmão de sócio do escritório de advocacia do diretor-presidente da Autoridade
Portuária de Santos, Anderson Pomini, ocupam cadeiras na direção do maior porto
do país, recebendo salário de até R$ 35 mil.
Pomini é homem de confiança do ministro do Empreendedorismo, Márcio
França (PSB), que comandou a pasta dos portos e aeroportos até setembro de
2023. Advogado, ele passou a ser mais conhecido no mundo da política quando era
aliado e secretário de João Doria (ex-PSDB) na Prefeitura de São Paulo. Rompeu
com o tucano em 2018 e ficou mesmo próximo de França, para quem advogou em
campanhas eleitorais.
Entre seus principais desafios, segundo ele, estão a melhoria na
eficiência do porto e as obras do túnel submerso entre Santos e Guarujá. No fim
do ano passado, o porto fechou um contrato de R$ 20 milhões com a Fundação
Carlos Alberto Vanzolini, ligada à Faculdade de Engenharia da USP, para ajudar
no projeto "jurídico e econômico" da obra.
Levado ao cargo por França, que ficou no Ministério dos Portos e
Aeroportos entre janeiro e setembro de 2023, Pomini foi mantido mesmo após a
nomeação do ministro Silvio Costa Filho (Republicanos), em um arranjo feito por
Lula para aumentar sua base de apoio no Congresso. No último ano, com a mudança
em Brasília, houve também uma derrubada de parte do comando do porto.
"Todos os diretores e assessores anteriormente indicados pelo ministro
Márcio França já foram substituídos em razão da troca do comando ministerial",
diz Pomini ao Metrópoles. Ele ressalta que os nomes indicados passaram pelo
"filtro rigoroso" da empresa, que exige boa formação e experiência para
funções, além de um pente fino da Agência de Inteligência Brasileira (Abin).
Ele admite, contudo, que parte desses nomes são de seu convívio na
advocacia. "Já trabalhei com alguns desses nomes no escritório e também em
outras funções públicas que ocupei, o que justamente os credenciam para o
critério confiança".
Um deles é o advogado Guilherme Fernandes de Souza, de 30 anos. No
primeiro item de seu currículo, consta que é "advogado associado" do escritório
Pomini Advogados desde 2018. Ele, no entanto, tem um escritório próprio e deixou
a sociedade. Foi também assessor da Secretaria Municipal de Justiça de São
Paulo, pasta que foi comandada por Pomini durante a gestão do ex-prefeito Bruno
Covas (morto em 2021). Souza foi nomeado como gerente de Relações
Institucionais do porto, com salário de R$ 33 mil brutos. Ele não foi
localizado pela reportagem.
Formado em administração de empresas, Rodrigo Tommasi Marinho é irmão de
Thiago Tommasi Marinho, sócio do escritório de advocacia de Pomini. Começou a
carreira na prefeitura de Guarulhos, comandada por Gustavo Enric Costa, o Guti,
que hoje é do PSD, mas era do PSB e correligionário de França quando nomeou
Rodrigo. Ele é gerente de planejamento estratégico e governança do Porto e
também ganha R$ 33 mil.
"Fui nomeado ao cargo de gerente de planejamento estratégico e
governança, devido minha formação em Administração de Empresas e pós graduação
em Sistema de Gestão Integrado (SGI), atuando no setor privado com
certificações, auditorias, KPI"s e planejamento estratégico", diz Tommasi, que
afirma ter sido convidado por Pomini.
Também advogado, Marcelo Zovico registrou, em 2012, em sua tese de
doutorado sobre políticas de Segurança Pública, um agradecimento a Pomini. Ele
chegou a ser filiado ao PSC – depois, deixou o partido – , e passou pela
Secretaria municipal de Transportes e pela CET na gestão João Doria (PSDB) e
Bruno Covas (PSDB).
"Para atuar na minha atual função na Autoridade Portuária de Santos é
necessário profundo conhecimento de Direito Administrativo, Constitucional e
Direitos Fundamentais, qualidades que legitimamente comprovei", afirma Zovico,
que ganha R$ 36 mil.
Com salário de R$ 36 mil, o ex-prefeito de Paranapanema e advogado
Edilberto Ferreira Beto Mendes (PSD) ocupa o cargo de superintendente de chefia
de gabinete da Presidência do Porto de Santos. Ele tem uma pendência na Justiça.
Foi condenado recentemente por improbidade administrativa em uma ação movida
pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) sobre mau uso de verbas públicas à
época de sua gestão, nos anos 2000.
Há espaço também para parentes de políticos. Cunhado do ex-deputado João
Paulo Cunha (PT), que cumpriu pena anos atrás após condenação no Mensalão,
Valter Pucharelli passou a vida ocupando cargos em feudos do petista. Foi
diretor de licitações nas prefeituras de Jandira, Carapicuíba e Osasco e também
teve um cargo na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo
(Ceagesp), onde a irmã de Cunha também foi nomeada. Ele não se manifestou até o
fechamento da reportagem.
Pucharelli é assessor da diretoria de Administração e Finanças, que
recentemente passou por uma mudança promovida pelo governo federal. Por
indicação do ministro Silvio Costa Filho, o comando dessa diretoria passou a
ser exercido por Julio Cézar Alves de Oliveira, que é funcionário de longa data
e ex-vice-presidente do Banco do Brasil. Julio Cezar não foi localizado pela
reportagem.
Os salários de funcionários dessa pasta ainda não foram registrados
publicamente pelo Porto de Santos, mas o Metrópoles apurou que devem ser
semelhantes aos de assessores e diretores de outras áreas, que giram entre R$
20 mil e R$ 35 mil.
No loteamento do Porto de Santos, coube até o irmão do deputado federal
Delegado da Cunha (Progressistas), que é opositor ferrenho do governo Lula e
flerta com o bolsonarismo. Claudio Randriney da Cunha é presidente do Instituto
da Cunha, ligado ao parlamentar, que faz caridade na baixada santista – com
filmagem e postagem de tudo nas redes sociais.
Em seu currículo, registra que foi tesoureiro da campanha do irmão ao
Congresso Nacional. É formado em administração de empresas e foi diretor
executivo do Sindicato dos Portuários. Procurado, ele não se manifestou. Ele
ganha R$ 26 mil mensais.
Também ligado a deputados do Progressistas, o advogado Johnni Hunter foi
presidente da Ceagesp por três anos, entre 2017 e 2020, entre os governos de
Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL), que trocou o comando da empresa por
militares e aliados. Hunter teve seu cargo questionado pela Controladoria-Geral
da União (CGU) e uma decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região
considerou que ele não teria currículo ou experiência para o cargo e tornou
nula a sua nomeação.
Ele diz ter sido convidado por Pomini ao cargo de gerente de Regulação
do Porto de Santos, por R$ 33 mil mensais. "Tenho todas as credenciais para a
função, vasta experiência em empresas públicas de grande porte, como a Ceagesp,
onde exerci o cargo de presidente por mais de 3 anos, dentre outras funções em
cargos públicos exercidos desde 2006", diz.
Entre os assessores com longo histórico na política, estão ainda Marcelo
Peres, da diretoria de operações, que passou pelo governo de São Paulo na
gestão de Alckmin e pela Assembleia Legislativa de São Paulo; Igor Bernardo de
Andrade, que fez carreira em cargos comissionados da prefeitura de São Vicente,
e o ex-procurador de Justiça José Carlos Gobbis Pagliuca, que foi comissionado
no governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Ex-assessor do ex-governador Rodrigo Garcia (PSDB), Marcus Sergius
Teixeira foi nomeado na Superintendência de Tecnologia da Informação, com
salário de R$ 33 mil. Mais alinhado à esquerda no litoral de São Paulo, o
ex-secretário de Meio Ambiente do Guarujá, Sidnei Aranha, ocupa a mesma pasta
relacionada ao Porto de Santos.
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