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Falsa avó

Falsa avó forçava mãe e filhos a trabalhar e recebia Bolsa Família, diz MPMG


O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) concluiu, na denúncia apresentada à Justiça, que a falsa avó dos meninos salvos do cárcere no Lagoinha, em Belo Horizonte, submeteu a mulher de 30 anos e seus três filhos, de 4, 6 e 9 anos, ao trabalho forçado durante pouco mais de 1 ano. Eles foram mantidos em um sítio onde foram encontrados cativeiros sem porta e sem janela em São Joaquim de Bicas, na região metropolitana da capital. Além disso, Terezinha e seus dois filhos — também denunciados pelo promotor — teriam pegado os documentos da mãe das crianças para poderem receber o Bolsa Família.

A reportagem de O TEMPO teve acesso com exclusividade, nesta sexta-feira (12 de maio), à denúncia do promotor Marcelo Dumont Pires, do MPMG de Igarapé. O documento, que tramita em segredo de Justiça por envolver crianças, confirmou questões já adiantadas pela nossa reportagem, como, por exemplo, que a família teria sido aliciada pelos suspeitos ao chegarem na rodoviária de BH, e que a mãe das crianças, Katia Cristina, era "escravizada" no local.

Na denúncia, o promotor aponta que o inquérito concluiu que a falsa avó, Terezinha Pereira dos Santos, de 53 anos, manteve a família em cárcere privado entre novembro de 2021 e fevereiro de 2023. "A denunciada Terezinha, mediante violência, grave ameaça e restrição da liberdade das vítimas, com o intuito de obter para si indevida vantagem econômica, constrangeu as crianças a trabalho forçado", disse Pires no documento.

O promotor pontuou ainda que a mãe e filhos foram abordados com uma proposta de emprego ao chegarem na rodoviária, mas que, desde que foram levados ao imóvel na região metropolitana de BH, a mulher teve o seus documentos retidos pela falsa avó e o filho dela. "Lado outro, apossaram-se de seus documentos para cadastrarem a família no programa, (Terezinha e o filho) apropriaram-se do respectivo cartão para receberem os valores relativos em nome da família", detalhou.

Terezinha foi presa no último dia 18 de abril pela Polícia Militar (PM), no Centro de Belo Horizonte. A prisão aconteceu após o recebimento de uma denúncia anônima de uma pessoa que passava pelo local e suspeitou da senhora, que estava com duas de suas netas no momento da prisão. Já o filho dela, de 31 anos, foi preso no início de fevereiro, logo após a morte de uma das crianças,já a filha dela, também denunciada pelo MPMG, acabou presa pela Polícia Civil em março.

Mãe das crianças também foi denunciada por homicídio

Apesar de indicar que, durante todo o período, Katia teria sido constrangida sob "violência ou grave ameaça", o MPMG também denunciou a mãe das crianças pelo homicídio do filho de 4 anos e pela tortura praticada contra eles durante o cárcere. Além disso, na denúncia, o promotor indicou que a mulher, que deveria proteger as crianças das torturas, "também os agredia".

Procurado, o MPMG informou, por nota, que, "em respeito ao ordenamento jurídico, que dispõe sobre a obrigatoriedade do sigilo deste processo, o promotor de Justiça não se manifestará sobre o caso mencionado".

Após ter acesso ao documento, O TEMPO procurou os advogados de Kátia para comentar a denúncia. Entretanto, a defesa da mulher afirmou apenas que não comentaria uma vez que o processo tramita em segredo de Justiça.

Relembre o caso

As crianças, de seis e nove anos, foram resgatadas no dia 21 de fevereiro, trancadas em um apartamento do bairro Lagoinha, na região Noroeste de Belo Horizonte. Segundo a Polícia Militar, elas estavam com sintomas de desnutrição e febre. Elas ficaram trancadas por três dias, sem alimentação.

Conforme informado pela polícia, as vítimas estavam magras, usavam roupas sujas e o ambiente onde elas estavam era escuro e encardido. Após o resgate, as crianças foram encaminhadas para o hospital Odilon Behrens, no bairro São Cristóvão, onde reaprenderam a comer devido à desnutrição severa.

A denúncia foi feita por uma vizinha, a vendedora Poliana Pereira dos Santos, de 37 anos. Ela acionou a polícia depois que percebeu que elas estavam sozinhas no apartamento e sem o auxílio de familiares. Ela tentou alimentar as crianças por um buraco na parede do apartamento. A porta da residência onde elas estavam foi trancada com um cadeado e correntes.

Conforme a denunciante, no local em que as crianças estavam, havia uma vasilha de comida com bicho. Em entrevista ao TEMPO, ela descreveu o cenário. "Encontramos muita sujeira, o cheiro era tão forte que, quando os policiais abriram a porta, nem eles aguentaram. A gente se emocionou muito quando vimos os dois, com os bracinhos fininhos, um deles sem conseguir nem falar. Aí começamos a chorar. Aqui tudo sujo, tudo podre, vasilha com bichos, colchão no chão", relatou.

Uma das crianças resgatadas pediu um pouco de comida para a vizinha depois que sentiu o cheiro do churrasco que era feito por ela. "Meu sobrinho estava andando de bicicleta aqui e, pelo buraquinho, ele viu e pediu um pouco de comida. Meu sobrinho, que tem mais ou menos a idade dele, veio até mim e contou. Fui até a porta e vi os dois, um deles disse que estava com fome e pediu churrasco para ele e o irmão. Pedi para ele abrir a porta, e ele falou que podia ser por ali mesmo. Falei que a vasilha não cabia no buraco. Ele, então, sugeriu que eu colocasse em uma sacolinha e disse 'eu estou com muita fome, me dá churrasco'", detalhou a vendedora Poliana dos Santos, de 37 anos, responsável por fazer a denúncia para a polícia.

A criança disse para a vendedora que elas estavam acompanhadas da avó. No entanto, o menino voltou a pedir comida durante a noite daquele dia, o que intrigou a vizinha e indicou de que elas estariam sozinhas.

A investigação apontou que as crianças são filhas de uma mulher, de 30 anos, que foi presa por maus-tratos a outro filho, morto no último dia 6 de fevereiro. O caso foi registrado em São Joaquim de Bicas, na região metropolitana da capital. De acordo com o boletim de ocorrência, no início do mês, a mulher levou o filho de 4 anos ao médico, mas a criança já estava morta. O menino chegou com lesões no olho, inchaço no pé e queimaduras no tornozelo.

O pai biológico das crianças, segundo as informações iniciais do caso, teria morrido de Covid-19, em 2020. Entretanto, três boletins de ocorrências, em nome dele, e datados de março de 2022 foram localizados pela reportagem e, em março, ele acabou sendo achado, bem e trabalhando, em uma fazenda no Norte de Minas.

Duas meninas, de 1 e 2 anos, que são irmãs dos meninos resgatados na última terça-feira, dia 21 de fevereiro, no bairro Lagoinha, estão em um abrigo, sob a tutela do Estado. A informação foi confirmada ao TEMPO pelo Conselho Tutelar de São Joaquim de Bicas, na região metropolitana de Belo Horizonte.

As meninas foram encaminhadas para unidade no dia 6 de fevereiro, depois que a mãe delas foi presa após levar um de seus cinco filhos, um garoto de 4 anos, com ferimentos para uma unidade hospitalar da cidade. O menino acabou morrendo devido à gravidade dos ferimentos que sofreu. No momento da prisão, a mulher teria omitido a existência dos dois filhos mais velhos, de 6 e 9 anos, resgatados na capital mineira.

Apesar da suspeita de maus-tratos contra o filho de 4 anos que recai sobre Kátia, os advogados acreditam que ela e a família tenham sido vítimas de uma quadrilha que alicia pessoas e as força ao trabalho análogo à escravidão. O garotinho morreu.

Cubículos com pequenas camas, sugerindo para um possível "cativeiro de crianças", foram encontrados na madrugada de 2 de março no lote em São Joaquim de Bicas onde uma família teria sido mantida em cárcere privado. A Polícia Militar (PM) compareceu ao local após um pedido de "ajuda" da advogada Andrezza Araújo, que chegou a defender Kátia Cristina, de 30 anos. Cheiro de 'carniça' foi sentido no 'cativeiro de crianças', no entanto era de cachorro morto.

Segundo a corporação, a "informante" relatou que no local onde o menino de 4 anos foi espancado e morto "existiria um compartimento trancado por telhas onde possivelmente poderiam estar outras crianças". Ao chegar no local, os militares do Grupo Especializado em Recobrimento (GER) encontraram os cubículos com "caminhas".

A Polícia Civil admitiu, nessa quinta-feira (2 de março), a possibilidade de as crianças resgatadas e do irmão delas, que morreu no início de fevereiro, terem sido torturados durante o cárcere privado no terreno em São Joaquim de Bicas.

Por meio de uma nota, a instituição policial informou que está apurando se o local "abandonado e possivelmente utilizado para manter crianças em cárcere privado e prática de torturas" teria relação com a investigação de maus-tratos que vitimaram a criança de 4 anos.

O cativeiro, que tinha acesso apenas pelo telhado, tinha um banheiro, uma televisão e uma espécie de portinhola que estava trancada e dava acesso a um cômodo superior. Um vídeo feito no local mostra militares quebrando uma entrada na parede e, também, o cômodo completamente escuro e fechado, que era coberto por telhas de amianto.

De acordo com a PM, o cômodo estava "caracterizado como local de cárcere" e fica em um ponto isolado do terreno, onde, se alguém gritasse, ninguém conseguiria ouvir. Assista ao vídeo que mostra o local:

Um quadro encontrado pela polícia indica como era a rotina das crianças supostamente mantidas no cativeiro. Conforme escrito no quadro, as crianças tinham uma rotina com horários intercalados entre os momentos de alimentação e de descanso. O quadro não aponta para um período do dia para em que elas deveriam estudar ou brincar.

A rotina, conforme escrito, começava às 7h, quando os menores acordavam, e se encerrava às 19h, quando eram colocadas para dormir. As orientações apontam para a existência de uma pessoa responsável por acompanhar as atividades das crianças.

O crime de ocultação de cadáver não está descartado no terreno onde mães e filhos teriam sido mantidos em cárcere privado. Os bombeiros compareceram ao endereço devido à reclamação de moradores de um forte odor que, possivelmente, seria de cadáver.

"Na análise primária, antes dos cães adentrarem verificamos que se tratava de carcaça de animal que estaria em decomposição há 15 dias", esclareceu o tenente Dutra, do Corpo de Bombeiros.

Apesar de o cadáver não ter sido localizado, não foi descartada a hipótese de que algum corpo tenha sido enterrado no lote. "Ainda não descartamos que haja outro crime, como possível ocultação de cadáver.

Kátia chegou a capital mineira com os quatro filhos e o marido após vir de Mário Campos, também na Grande BH. A mulher estava grávida e, logo após ser aliciada para uma proposta de trabalho, ainda na rodoviária, se mudou para São Joaquim de Bicas. Quando já estava no sítio, entrou em trabalho de parto e foi levada para uma maternidade.

"Quando retornou para o sítio, ela teve a bebê retirada com a alegação de que a assistente social do hospital havia entrado em contato pedindo o retorno", disse o advogado Gregório Andrade. A bebê nasceu prematura e, por isso, demandava cuidados, porém Kátia informou que a filha estava bem.

A bebê, conforme dito pelo advogado, foi levada por Terezinha Pereira dos Santos, de 53 anos, que é apontada como a proprietária do sítio e que ainda não foi localizada, onde Kátia e a família ficaram em cárcere. "Kátia quis ir junto, mas foi impedida por Terezinha. Ela ficou seis meses sem ver a filha. Tudo isso me foi repassado pela Kátia em conversa que tive com ela nesta quinta-feira (2 de março)", contou Andrade.

As pessoas que residem nas proximidades do possível "cativeiro de crianças" revelaram detalhes da rotina da casa e dos moradores do terreno, que possui diversas moradias pequeninas e uma construção com portas e passagens concretadas. Entretanto, todos eles quiseram falar em anonimato por medo, já que a dona do terreno onde o possível cativeiro foi localizado está desaparecida.

A mulher que no bairro atendia pelo nome de Maria, e em Belo Horizonte era conhecida como Terezinha, é suspeita de manter duas crianças de 6 e 9 anos em cárcere privado. Conforme os vizinhos, a mulher gostava de ser chamada de "Maria Mãe de Santo" e era conhecida por espalhar o pânico entre os moradores do bairro Imperador.

Kátia Cristina, mãe das crianças encontradas em cárcere privado, teve negado o pedido de habeas corpus. De acordo com o advogado Gregório Andrade, que era responsável pela defesa, o pedido de soltura não foi aceito pela falta da certidão de nascimento das crianças. Documento que ainda não teria sido localizado pela defesa.

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