A Polícia Militar fez uma operação na noite deste sábado na Gardênia Azul, favela da Zona Oeste do Rio de onde — segundo a investigação da Delegacia de Homicídios (DH) — saíram os suspeitos do triplo homicídio de médicos na Barra da Tijuca. Foram apreendidas 117 trouxinhas de maconha, 113 envelopes de cocaína e 78 de crack, além de R$ 1208. Agentes do Batalhão de Choque avistaram homens em atitude suspeita e, após realizar um cerco, detiveram um dos suspeitos. A ocorrência foi registrada na 32ª DP (Taquara).
A Gardênia Azul foi dominada por milicianos por três décadas, mas, ao longo do último ano, paramilitares que dominavam a favela fizeram um acordo com a maior facção do tráfico do Rio. A partir do ano passado, os criminosos passaram a vender drogas no local.
Pelo menos dois dos quatro suspeitos de matar os médicos já eram investigados por execuções em guerra contra a milícia na mesma região: contra Philipp Motta Pereira, o Lesk, e Ryan Soares de Almeida haviam mandados de prisão por crimes cometidos na Rua Araticum, que ficou conhecida como Rua da Morte e tem sido palco da disputa territorial entre as duas facções criminosas desde o ano passado.
esk e Ryan seriam integrantes da chamada Equipe Sombra, responsável justamente por ataques a tiros contra rivais para retomada desses espaços. Em fotos publicadas nas redes sociais, Lesk chegou até a aparecer com uma camisa com o número 121, referente ao artigo em que está previsto o crime de homicídio no Código Penal. Na roupa, também está a inscrição BMW, apelido de Juan Breno Malta, outro membro da quadrilha.
Guerra entre tráfico e milícia
A ligação entre o crime e a guerra entre traficantes e milicianos na Zona Oeste entrou no radar da polícia após a análise de uma comunicação entre traficantes interceptada pouco antes do ataque. "Acho que é Posto 2", disse um homem que, segundo os investigadores, faz parte da quadrilha que domina a Gardênia Azul. Apesar de o quiosque onde os médicos estavam ficar entre os postos 3 e 4, a polícia acredita que o criminoso tentava comunicar a um comparsa a localização do miliciano Taillon de Alcântara Pereira Barbosa, de 26 anos, filho de Dalmir Pereira Barbosa, chefe do grupo paramilitar de Rio das Pedras.
A polícia já sabe que Taillon não estava na praia durante a madrugada, mas seus desafetos o teriam confundido com o ortopedista Perseu Ribeiro de Almeida. De acordo com as polícias Civil e Federal, Perseu tem peso, altura, cabelo e barba parecidos com Taillon.
Homicídios crescem 150% na região
Nos últimos dez anos, a Barra da Tijuca e o Recreio dos Bandeirantes experimentaram uma explosão de desenvolvimento. Alçada a "casa" dos Jogos Olímpicos de 2016, a região recebeu hotéis de redes internacionais, entrou na rota da alta gastronomia da cidade e virou, ao mesmo tempo, destino turístico e centro financeiro do Rio. A reboque dos investimentos, no entanto, veio o crime. Antes considerados "ilhas" de segurança na capital, Barra e Recreio viraram o epicentro de guerras entre traficantes, milicianos e bicheiros, passaram a ser palco de crimes bárbaros — como o ataque que vitimou três médicos na orla na semana passada — e assistem a um aumento vertiginoso de assassinatos.
Segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP), de janeiro a agosto de 2023 foram registradas na área coberta pelo 31º BPM — que abrange, além de Barra e Recreio, Itanhangá, Joá, Vargem Grande e Vargem Pequena — 72 mortes violentas (que incluem homicídios dolosos, latrocínios, lesões corporais seguidas de morte e mortes por intervenção de agentes do estado). Esse é o número mais alto de casos na região desde 2003. Em comparação com o mesmo período do ano passado, quando 29 pessoas foram mortas, os assassinatos mais que duplicaram — o aumento foi de 150%. Junto com o vizinho Jacarepaguá, Barra e Recreio são as áreas onde casos de letalidade violenta mais cresceram em todo o Estado do Rio — que, no mesmo período, registrou queda de 1% nas mortes violentas.
A escalada de assassinatos foi precedida por mudanças na geopolítica do crime no Rio que levaram a disputas entre facções do tráfico e milícias por territórios na região da Baixada de Jacarepaguá — que compreende uma série de bairros da Zona Oeste, da Praça Seca até Grumari, passando por Jacarepaguá, Barra e Recreio. A crise começou ainda em 2021, a partir da morte de Wellington da Silva Braga, o Ecko, então chefe da maior milícia do Rio, que fincou suas bases em Campo Grande, também na Zona Oeste.
EXTRA GLOBO