Os cientistas projetaram uma ferramenta de IA (inteligência artificial) capaz de decodificar o DNA de um tumor cerebral durante a cirurgia, determinando sua identidade molecular. Essa informação é crucial para o tratamento e, sob a abordagem atual, pode levar dias ou até semanas para ser obtida.
Para quem tem pressa:
- Cientistas projetaram uma ferramenta de IA capaz de decodificar o DNA de um tumor cerebral durante a cirurgia;
- Além de crucial para o tratamento, essa informação guia decisões tomadas pelos neurocirurgiões durante o procedimento em si;
- Entre elas, estão: quanto remover do tecido cerebral e colocar (ou não) medicamentos diretamente no cérebro operado;
- Essa ferramenta pode impulsionar o desenvolvimento da oncologia de precisão em tempo real, segundo Kun-Hsing Yu, um dos autores do estudo.
Conhecer o tipo molecular de um tumor permite que os neurocirurgiões tomem decisões, por exemplo: quanto remover do tecido cerebral e colocar (ou não) diretamente no cérebro medicamentos que matam o tumor – enquanto o paciente ainda está na mesa de operação.
Um relatório sobre o trabalho com essa IA, liderado por pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade Harvard (EUA) foi publicado na revista científica Med.
Ajuda da IA
Ter uma noção precisa antes de decidir o que fazer com o tecido cerebral é importante por dois motivos:
Remover muito tecido cerebral quando o tumor é menos agressivo pode afetar a função neurológica e cognitiva do paciente, por exemplo.
Remover muito pouco quando o tumor é altamente agressivo pode deixar para trás tecido maligno que pode crescer e se espalhar rapidamente.
Neste momento, mesmo a prática clínica de ponta não pode traçar o perfil molecular dos tumores durante a cirurgia. Nossa ferramenta supera esse desafio extraindo sinais biomédicos até então inexplorados de lâminas de patologia congeladas.
Kun-Hsing Yu, um dos autores do estudo e professor assistente de informática biomédica no Instituto Blavatnik, da Faculdade de Medicina de Harvard
Conhecer a identidade molecular de um tumor durante a cirurgia também é valioso porque alguns tipos se beneficiam do tratamento no local com medicamentos colocados diretamente no cérebro no momento da operação.
A capacidade de determinar o diagnóstico molecular intraoperatório em tempo real, durante a cirurgia, pode impulsionar o desenvolvimento da oncologia de precisão em tempo real.
Kun-Hsing Yu, um dos autores do estudo e professor assistente de informática biomédica no Instituto Blavatnik, da Faculdade de Medicina de Harvard
A capacidade da nova ferramenta de agilizar o diagnóstico molecular pode ser particularmente valiosa em áreas com acesso limitado à tecnologia para realizar o sequenciamento genético rápido do câncer.
Além das decisões tomadas durante a cirurgia, o conhecimento do tipo molecular de um tumor fornece pistas sobre sua agressividade, comportamento e provável resposta a vários tratamentos. Tal conhecimento pode informar as decisões pós-operatórias.
Nova ferramenta
A abordagem diagnóstica intraoperatória padrão usada atualmente envolve retirar tecido cerebral, congelá-lo e examiná-lo ao microscópio.
Uma grande desvantagem é que o congelamento do tecido tende a alterar a aparência das células ao microscópio e pode interferir na precisão da avaliação clínica.
Além disso, o olho humano, mesmo ao usar microscópios potentes, não consegue detectar com muita assertividade variações genômicas sutis numa lâmina.
A nova abordagem, usando a ferramenta com IA, supera esses obstáculos.
Chamada Charm (Cryosection Histopathology Assessment and Review Machine), a ferramenta está disponível gratuitamente para outros pesquisadores.
Ele ainda precisa ser validado clinicamente por meio de testes em ambientes do mundo real e liberado pelo FDA – a Anvisa dos EUA – antes da implantação em hospitais, conforme informou a equipe da pesquisa.
Como a ferramenta foi treinada
A Charm foi desenvolvida usando 2.334 amostras de tumores cerebrais de 1.524 pessoas com glioma de três diferentes populações de pacientes.
Quando testada num conjunto nunca antes visto de amostras cerebrais, a ferramenta distinguiu tumores com mutações moleculares específicas com 93% de precisão.
Ela também classificou com sucesso três tipos principais de gliomas com características moleculares distintas que carregam diferentes prognósticos e respondem de maneira diferente aos tratamentos.
Indo um passo adiante, a ferramenta capturou com sucesso as características visuais do tecido ao redor das células malignas.
Ela foi capaz de detectar áreas reveladoras com maior densidade celular e mais morte celular nas amostras, ambas sinalizando tipos de glioma mais agressivos.
A ferramenta também foi capaz de identificar alterações moleculares clinicamente importantes num subconjunto de gliomas de baixo grau, um subtipo de glioma que é menos agressivo e, portanto, menos propenso a invadir o tecido circundante.
Cada uma dessas mudanças também sinaliza propensão diferente para crescimento, disseminação e resposta ao tratamento.
A ferramenta conectou ainda mais a aparência das células – a forma de seus núcleos, a presença de edema ao redor das células – com o perfil molecular do tumor.
Isso significa que o algoritmo pode identificar como a aparência de uma célula se relaciona com o tipo molecular de um tumor.
Essa capacidade de avaliar o contexto mais amplo em torno da imagem torna o modelo mais preciso e mais próximo de como um patologista humano avaliaria visualmente uma amostra de tumor, segundo Yu.
Com informações da Universidade Harvard (em inglês)