A reforma do Imposto de Renda (IR) cria um constrangimento moral para o paĂs, forçando uma discussão na sociedade sobre a desigualdade tributĂĄria, disse nesta quarta-feira (16) o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Em entrevista ao programa Sem Censura, da TV Brasil, o ministro disse que o projeto enviado ao Congresso hĂĄ cerca de um mĂȘs baseia-se na justiça social.
Para o ministro, a busca pela redução das desigualdades sociais por meio do pagamento de tributos pelos mais ricos deixa os opositores sem argumento para se contrapor à reforma do Imposto de Renda.
"Acredito que criamos um constrangimento moral no paĂs. O que estĂĄ sendo dito? O que estĂĄ errado? A gente estĂĄ a fim. DĂĄ para melhorar? Óbvio! VocĂȘ tem uma ideia melhor? Até agora não apareceu", declarou Haddad, dizendo que o governo estĂĄ aberto a contribuições que melhorem o projeto.
Na avaliação de Haddad, o constrangimento moral de ser retratado como defensor da desigualdade tem inibido inclusive a proliferação de fake news sobre as mudanças no Imposto de Renda. Inclusive porque a proposta tem impacto fiscal zero e não farĂĄ o governo arrecadar mais, apenas redistribuirĂĄ renda.
"Quando bota uma coisa na mesa, a primeira coisa que acontece do lado de lĂĄ é o cara falar: "como posso mentir para a população?" E ficou todo mundo: "o que a gente faz com esse projeto?" Nem fake news estão conseguindo fazer", acrescentou o ministro.
Andar de cima
O ministro comparou a tributação dos super-ricos com o caso do morador de uma cobertura que não paga condomĂnio. "Eu diria que [a lógica do projeto] é quem ganha muito, começa a pagar alguma coisa, para a gente desonerar quem ganha até R$ 5 mil. LĂĄ no andar de cima, na cobertura, não vai doer se o cara começar a pagar condomĂnio", justificou Haddad, ao responder se a lógica da reforma seria tributar mais quem ganha mais e desonerar quem ganha menos.
O governo propõe a isenção de IR a 10 milhões de brasileiros que ganham até R$ 5 mil por mĂȘs e o aumento do desconto para 5 milhões que recebem entre R$ 5 mil e R$ 7 mil. Em troca, pretende aumentar o IR para quem ganha a partir de R$ 50 mil por mĂȘs (R$ 600 mil por ano) e introduzir uma alĂquota mĂnima de 10% para quem recebe R$ 100 mil mensais (R$ 1,2 milhão por ano).
Atualmente, cerca de 141 mil pessoas que recebem a partir de R$ 50 mil por mĂȘs pagam apenas 2% de alĂquota efetiva do Imposto de Renda. Isso porque a maior parte dos rendimentos dos super-ricos vem de dividendos, isentos de tributação, ou mascarado com renda de pessoas jurĂdicas.
Décimo quarto salĂĄrio
Haddad apresentou estatĂsticas sobre a desigualdade do sistema tributĂĄrio brasileiro. O ministro ressaltou que, em algumas profissões, como o professor de escola pĂșblica e o policial que ganham até R$ 5 mil, a isenção equivalerĂĄ, na prĂĄtica, a um décimo quarto salĂĄrio.
"Quem ganha R$ 1 milhão para cima paga 2% de alĂquota. O sistema tributĂĄrio brasileiro é considerado um dos dez piores do mundo. Vamos combinar que quem ganha R$ 1 milhão por ano no Brasil são os super-ricos. Legal ele ganhar. Mérito dele, talento dele. Mas não paga nem 2% de Imposto de Renda, contra um policial e uma professora que paga isso", declarou o ministro.
Programa de governo
Para o ministro, a reforma do Imposto de Renda pretende reduzir desigualdades históricas do Brasil. "Esse projeto tem um Ășnico fundamento: buscar justiça social. Não queremos arrecadar um centavo a mais, um centavo a menos. Queremos buscar uma coisa que este paĂs demora a conquistar. Até a abolição da escravidão no Brasil foi tardia. Fomos o Ășltimo paĂs a abolir a escravidão", destacou.
Haddad lembrou que o então presidente eleito Luiz InĂĄcio Lula da Silva o convidou para ser ministro da Fazenda em novembro de 2022, durante a 27ÂȘ ConferĂȘncia das Nações Unidas sobre Mudança ClimĂĄtica (COP 27), no Egito. Na ocasião, Haddad explicou que só aceitaria o cargo se Lula concordasse com plataformas históricas da esquerda brasileira, como a cobrança de impostos sobre os mais ricos e a revisão de benefĂcios fiscais a grandes empresas que aumentam as desigualdades.
"Vou resgatar o piso da educação e da saĂșde, botar o rico no Imposto de Renda, como o senhor falou na campanha, tem empresa com benefĂcio que não faz nada pelo paĂs, vamos ter que enfrentar esses caras. A partir daĂ, fomos construindo o que seria a polĂtica econômica", recordou Haddad na entrevista.
Fonte: Wellton MĂĄximo - Repórter da AgĂȘncia Brasil