O dólar disparou ao longo da tarde e encerrou a sessão desta quarta-feira (27) acima da linha de R$ 5,91, no maior nível nominal da história do real. Analistas e operadores atribuíram a derrocada da moeda brasileira ao anúncio do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sobre a isenção de Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil por mês.
Ao longo das últimas semanas já havia um desconforto com os adiamentos seguidos da divulgação do plano fiscal, que, segundo prometido inicialmente, seria realizada logo após as eleições municipais. A adoção de uma medida que representa renúncia de receitas acentuou ainda mais a desconfiança dos investidores em relação à disposição do governo Lula de promover uma mudança estrutural na dinâmica do gasto público capaz não apenas de levar ao cumprimento das metas do arcabouço fiscal como sinalizar estabilização futura da relação dívida/PIB.
O anúncio dessa medida de isenção de IR praticamente junto com o pacote, embora sejam textos distintos, é muito ruim. Tira o brilho do pacote que já estava ofuscado pela demora – afirma a economista-chefe da Buysidebrazil, Andréa Damico, ressaltando que no exterior o dólar recuou, em especial na comparação com outras divisas fortes.
O anúncio formal das medidas de contenção de gastos deve ser realizado nesta quinta-feira (28). O plano inclui mudanças nas regras para concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC), no abono salarial, na política de reajuste do salário mínimo e na previdência e pensão de militares. Haddad confirmou que alterações no Vale Gás e a limitação dos chamados "supersalários" também estão no pacote.
Em alta já na primeira etapa de negócios, o dólar ganhou impulso adicional no início da tarde desta quarta justamente com a notícia do pronunciamento de Haddad traria a isenção do IR, furando o nível psicológico e técnico de R$ 5,90 e renovando máxima a R$ 5,9289 por volta das 16h. No fim da sessão, a moeda avançava 1,81%, cotada a R$ 5,9135, o maior nível nominal de fechamento da história do real, acima de R$ 5,9008 em 13 de maio de 2020. No chamado intraday, o pico nominal foi R$ 5,9718, em 14 de maio de 2020.
– A sinalização da isenção do IR é bastante ruim. Em um momento em que todo mundo espera o anúncio do corte de gastos, vem junto uma medida no sentido contrário, com redução de arrecadação – afirma a economista-chefe do Ouribank, Cristiane Quartaroli.
Haddad vinha tentando dissuadir Lula da ideia de adotar a isenção do IR neste momento. O esforço envolveu até o futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo. Lula foi alertado de que o pacote de cortes acabaria sendo ofuscado pela "novidade da isenção do IR". Ainda assim, o presidente resolveu seguir adiante com a ideia.
Para o economista André Galhardo, consultor econômico da plataforma de transferências internacionais Remessa Online, o descolamento do real reflete o receio de que "o governo, ao tentar preservar apoio popular, adote um esforço tímido para cortar despesas", enquanto apoia o consumo com a reforma do Imposto de Renda.
*Com informações AE