BRASÍLIA – O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), enviou nesta terça-feira (26), à Procuradoria-Geral da República (PGR) o relatório de 884 páginas em que a Polícia Federal indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e mais 36 por crimes de suposto golpe de Estado, organização criminosa e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022.
Moraes retirou o sigilo da investigação. Para ele, não há mais necessidade de manter o caso sob segredo, tampouco das investigações conexas. O documento traz dezenas de diálogos em áudio e texto trocados pelos investigados. O ministro ainda determinou que seja concedido acesso aos autos às defesas de investigados.
Confira abaixo as penas para cada crime citado pela PF:
- Golpe de Estado: 4 a 12 anos de prisão;
- Abolição violenta do Estado democrático de Direito: 4 a 8 anos de prisão;
- Integrar organização criminosa: 3 a 8 anos de prisão.
As investigações apontaram que os indiciados se estruturaram por meio de divisão de tarefas, o que permitiu a individualização das condutas e a constatação da existência dos seguintes grupos nomeados da seguinte forma pela PF (alguns investigados aparecem em mais de um núcleo):
Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral
- Anderson Torres
- Angelo Martins Denicoli
- Fernando Cerimedo
- Eder Lindsay Magalhães Balbino
- Guilherme Marques Almeida
- Hélio Ferreira Lima
- Mauro Cesar Barbosa Cid
- Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros
- Tércio Arnaud Tomaz
Núcleo responsável por incitar militares à aderirem ao golpe de Estado
- Ailton Gonçalves Moraes Barros
- Bernardo Romão Correa Neto
- Mauro Cesar Barbosa Cid
- Paulo Renato de Oliveira Figueiredo Filho
- Walter Souza Braga Netto
Núcleo jurídico
- Anderson Gustavo Torres
- Amauri Feres Saad
- Filipe Garcia Martins Pereira
- José Eduardo de Oliveira e Silva
- Mauro Cesar Barbosa Cid
Núcleo operacional de apoio às ações golpistas
- Alex de Araújo Rodrigues
- Bernardo Romão Correa Neto
- Cleverson Ney Magalhães
- Hélio Ferreira Lima
- Rafael Martins de Oliveira
- Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros
Núcleo de inteligência paralela
- Alex de Araújo Rodrigues
- Bernardo Romão Correa Neto
- Cleverson Ney Magalhães
- Hélio Ferreira Lima
- Rafael Martins de Oliveira
- Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros
Núcleo de oficiais de alta patente com influência e apoio a outros núcleos
- Almir Garnier Santos
- Estevam Theophilo Gaspar de Oliveira
- Laércio Vergílio
- Mario Fernandes
- Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira
- Walter Souza Braga Netto
Confira os próximos passos do inquérito
Agora cabe à PGR se manifestar contra ou a favor do resultado da investigação. Ela fará a denúncia, ou mandará arquivar ou pedir mais investigações.
Caso a PGR se manifeste favoravelmente sobre o prosseguimento da ação, denunciado ao STF os indiciados pela PF, caberá aos ministros do Supremo julgar se aceitam ou rejeitam a posição da procuradoria.
Se a maioria dos ministros entenderem que há elementos suficientes para acatar a denúncia da PGR, os indiciados passarão à condição de réus e começarão a responder ao processo penal. Só quando houver decisão definitiva ou não existir mais possibilidade de recurso, eles são considerados culpados.
Bolsonaro desembarcou em Brasília na segunda-feira (25) e negou participação na trama golpista identificada em inquérito da PF. "Uma loucura falar em golpe, uma loucura. Golpe com um general da reserva e cinco oficiais? E outra coisa, golpe existe em cima de uma autoridade constituída, que já tomou posse. O Lula tinha tomado posse? Ninguém tinha tomado posse. Só se fosse em cima de mim o golpe", declarou Bolsonaro na chegada à capital.
Investigação tem áudio em que Mauro Cid cita data da diplomação de Lula
Moraes manteve o sigilo sobre a delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. Mas já se sabe que Cid tratou de um golpe de Estado com oficiais do Exército, após a vitória de Lula nas urnas. A acusação está no relatório da PF sobre o caso, que foi encaminhado ao STF na última quinta-feira (21).
Em uma das mensagens de áudio, enviada por aplicativo, Mauro Cid fala ao general Mario Fernandes, que era o número 2 da Secretaria-Geral da Presidência, sobre a necessidade de o suposto plano ser colocado em prática "antes do dia 12". Investigadores concluíram que a dupla cita o 12 de dezembro de 2022, data para a diplomação da chapa Lula e Geraldo Alckmin, que marcaria o reconhecimento da eleição de ambos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
"Dia 12 seria Teria que ser antes do dia 12, né? Mas com certeza não vai acontecer nada. E sobre os caminhões, pode deixar que eu vou comentar com ele, porque o Exército não pode "papar mosca" de novo, né? É área militar, ninguém vai se meter", diz Cid. O "ele", segundo a PF, é Bolsonaro. Já os "caminhões" são os veículos enviados por fazendeiros para o Quartel General do Exército, em Brasília, para engrossar o acampamento que pedia intervenção militar contra a posse de Lula.
No mesmo diálogo, Cid garante que vai conversar com Bolsonaro. "Não, pode deixar, general. Vou conversar com o presidente. O negócio é que ele tem essa personalidade às vezes, né? Ele espera, espera, espera, espera pra ver até onde vai, né? Ver os apoios que tem. Só que às vezes o tempo tá curto, né? Não dá pra esperar muito mais passar, né?"", afirma o tenente-coronel. Ele firmou acordo de delação com a PF, dando informações sobre esta investigação e outras que envolvem Bolsonaro.
Indiciado há quatro dias, com Cid, Fernandes e outros 34, Bolsonaro desembarcou em Brasília nesta segunda-feira (25) e negou participação na trama golpista identificada em inquérito da PF. "Uma loucura falar em golpe, uma loucura. Golpe com um general da reserva e cinco oficiais? E outra coisa, golpe existe em cima de uma autoridade constituída, que já tomou posse. O Lula tinha tomado posse? Ninguém tinha tomado posse. Só se fosse em cima de mim o golpe", declarou Bolsonaro na chegada à capital.
General falou da data da diplomação de Lula em outros diálogos
Já o general Mario Fernandes foi preso pela PF na Operação Contragolpe, na última terça-feira (19), com outros três militares do Exército e um agente da Polícia Federal acusados de planejar um golpe de Estado com assassinatos da chapa presidencial vencedora de 2022 e do ministro Alexandre de Moraes, do STF e TSE. Fernandes é apontado como um dos principais incentivadores da ruptura institucional e mentor do plano "Punhal verde amarelo", que previa as execuções das autoridades,
Áudios atribuídos ao general Fernandes mostram como ele tinha a intenção de envolver as Forças Armadas no suposto plano de golpe de Estado de 2022, apontado em inquérito da PF que, concluído na quinta, culminou no indiciamento de 37 pessoas, incluindo Bolsonaro, Mauro Cid e diversos outros militares de alta patente do Exército.
"Durante a conversa que eu tive com o presidente, ele citou que o dia 12, pela diplomação do vagabundo, não seria uma restrição? Qualquer ação nossa pode acontecer até 31 de dezembro. Tudo. Mas aí na hora: pô, presidente. A gente já perdeu tantas oportunidades", mostra o áudio.
Em 12 de dezembro de 2022, logo após a cerimônia de diplomação, apoiadores de Bolsonaro tentaram invadir a sede da PF, na área central de Brasília, e incendiaram carros e ônibus, além de quebrar vidraças de prédios particulares. Investigação mostrou que o grupo havia saído do acampamento em frente ao QG do Exército.
O grupo tentou invadir a PF para libertar o Cacique Tserere Xavante, um indígena bolsonarista preso momentos antes, perto do STF, com a intenção de atacar o prédio. Sem conseguir entrar no STF, apoiadores de Bolsonaro passaram a quebrar o que viam pela frente. Três deles foram presos após planejar o atentado a bomba no aeroporto de Brasília em 24 de dezembro de 2022.
"Tu viu que já começaram a radicalizar, né? A prisão do cacique ali já levou. Ó, aqui no início da Asa Norte, da W3 Norte, na sede da Polícia Federal, o pau tá comendo. Os distúrbios urbanos já iniciaram. Agora vai rolar sangue", comemorou o general Mário Fernandes em áudio enviado ao coronel do Exército Reginaldo Vieira de Abreu, conhecido como Velame.
O general Mário Fernandes também demonstrou empolgação com os atos de vandalismo em conversa com o general Luiz Eduardo Ramos, ex-ministro de Bolsonaro. "Vai começar a rolar sangue. E nós sabemos que isso aí já era um prenúncio, já era anunciado. Certo? Vai acontecer, porra, não tem jeito. Quanto mais se retardar uma ação efetiva, mais vão acontecer eventos como esse", disse Fernandes.
A PF afirma que os acampamentos em frente a quartéis do Exército após a derrota de Bolsonaro nas urnas faziam parte de um movimento orquestrado pelos militares e que o general Fernandes se comunicava frequentemente com esses grupos, mas que "os principais diálogos em torno de temas antidemocráticos e/ou relacionados aos ideários golpistas" eram travados com militares.
"Talvez seja isso que o alto comando, que a defesa quer. O clamor popular, como foi em 64. Nem que seja pra inflamar a massa. Para que ela se mantenha nas ruas", afirma o general em áudios que circulavam nos grupos de apoiadores da intervenção militar. Ele se refere ao golpe de 1964, que derrubou um presidente civil eleito democraticamente e deu início a uma ditadura militar, que durou até 1985.
"Quatro linhas da Constituição é o c
"
No inquérito, policiais federais apontam o general Fernandes como um dos mais radicais do grupo que tratava do tema. "O senhor me desculpe a expressão, mas quatro linhas é o c
Quatro linhas da Constituição é o c
Nós estamos em guerra, eles estão vencendo, está quase acabando e eles não deram um tiro por incompetência nossa", afirmou um oficial do Exército. "Meu pensamento é o mesmo, meu amigo. Eu já dei uma bicuda nessas quatro linhas há muito tempo", respondeu o general Mário Fernandes.
Em 4 de novembro de 2022, o coronel Velame enviou o seguinte áudio para o general Mário Fernandes. "Esse pessoal acima da linha da ética não pode estar nessa reunião, tem que ser petit comité, pô. Tem que ser a "rataria", ele e a "rataria". Com o comandante do exército, mas petit comité, essa galera não pode estar aí, p , aí tem que debater o que que vai ser feito."
Publicamente, Bolsonaro dizia querer sempre agir "dentro das quatro linhas da Constituição". Aliados dele repetiam isso ao comentar ações para impedir a posse de Lula, alegando que havia irregularidades no sistema eleitoral brasileiro, sem nunca terem mostrado provas. O general Fernandes pregava isso em grupos de aplicativos. "Tá na cara que houve fraude. Tá na cara. Não dá mais pra gente aguardar essa p ", diz em um dos áudios que a PF apontou ser dele.
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