Nos últimos dias, o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, tomou uma atitude inesperada que despertou a atenção da comunidade internacional. Conhecido por manter uma relação próxima com a Rússia, Erdogan exigiu que o presidente russo, Vladimir Putin, devolva à Ucrânia a península da Crimeia, anexada em 2014. Essa declaração provocou surpresa e especulações sobre o futuro das relações entre os dois países.
Assista esse vídeo para entender melhor:
A Crimeia, uma península estrategicamente localizada no Mar Negro, foi tomada pela Rússia em 2014, após um referendo amplamente criticado pela comunidade internacional. Na época, tropas russas ocuparam a região e, rapidamente, organizaram um plebiscito, cujo resultado foi favorável à anexação pela Rússia. Porém, a legitimidade desse referendo foi contestada por muitos países, incluindo membros da ONU, que consideraram o processo ilegal.
Desde então, a Crimeia tem sido um ponto de discórdia internacional, com sanções sendo impostas à Rússia e uma série de condenações diplomáticas. No entanto, Erdogan, até então, manteve uma postura amigável em relação a Moscou, o que torna sua recente declaração ainda mais intrigante.
A Turquia, membro da OTAN desde 1952, possui uma posição geopolítica delicada. Embora faça parte da aliança militar ocidental, o país tem mantido boas relações com a Rússia, especialmente no que diz respeito a acordos energéticos e comerciais. A construção de uma usina nuclear em solo turco com participação russa e a cooperação no fornecimento de gás natural são exemplos dessa parceria.
Quando a Rússia invadiu a Ucrânia em fevereiro de 2022, a Turquia não seguiu o caminho de muitos países ocidentais que impuseram sanções à Rússia. Pelo contrário, Erdogan optou por uma abordagem mais equilibrada, negociando com ambos os lados. Essa postura reforçou a percepção de que a Turquia estava jogando um "jogo duplo", mantendo boas relações tanto com Moscou quanto com Kiev.
Apesar de sua proximidade com a Rússia, Erdogan nunca reconheceu oficialmente a anexação da Crimeia. No entanto, o momento da recente exigência, em meio a uma guerra em curso, levanta questões sobre as motivações do líder turco. Uma explicação pode estar na defesa dos direitos dos tártaros, uma minoria étnica que vive na Crimeia e que possui laços históricos profundos com a Turquia.
Desde que a Rússia tomou o controle da Crimeia, os tártaros têm denunciado perseguições e violações de direitos por parte das autoridades russas. Erdogan, ao afirmar que "os tártaros da Crimeia devem viver livremente, com segurança e em paz em sua própria terra natal", envia uma mensagem forte não apenas para Putin, mas para o mundo, posicionando-se como defensor dos direitos humanos. Isso, por sua vez, também pode ser uma estratégia para fortalecer sua imagem internacional e ganhar apoio de nações ocidentais.
A grande questão que surge é: Erdogan realmente acredita que a Rússia devolverá a Crimeia? A resposta mais provável é que não. A Crimeia tem um valor estratégico inestimável para a Rússia, sendo a sede da sua frota no Mar Negro e uma região crucial para o controle de rotas comerciais. Para Putin, abrir mão da península seria um golpe devastador, tanto no plano militar quanto no econômico.
Dessa forma, a exigência de Erdogan pode ser vista mais como uma jogada política. Ao adotar uma posição mais crítica em relação à Rússia, ele pode estar buscando melhorar suas relações com o Ocidente, especialmente com os Estados Unidos e a União Europeia, que têm pressionado por uma resposta unificada contra a agressão russa na Ucrânia.
Esta não é a primeira vez que Erdogan desafia Putin. Em 2023, o presidente turco permitiu que comandantes ucranianos que estavam em solo turco retornassem à Ucrânia, rompendo um acordo com a Rússia e provocando irritação em Moscou. Esses episódios mostram que, apesar de uma relação aparentemente cooperativa, a aliança entre Erdogan e Putin é mais frágil e complexa do que parece.
Ao pedir a devolução da Crimeia, Erdogan pode estar testando os limites dessa relação e, ao mesmo tempo, reforçando sua posição dentro da OTAN e no cenário internacional. A Turquia, como um dos poucos países que mantém diálogo com ambos os lados do conflito, está numa posição estratégica única, e Erdogan parece determinado a aproveitar isso ao máximo.
Seja qual for o próximo movimento de Erdogan, uma coisa é certa: ele está jogando um jogo geopolítico de alto risco. Ao equilibrar as relações com a Rússia e o Ocidente, o líder turco tenta fortalecer a posição da Turquia no cenário global e garantir que seu país continue a ser um ator relevante no conflito entre Ucrânia e Rússia.
No entanto, esse equilíbrio pode facilmente se desestabilizar. Se a Rússia sentir que está sendo traída pela Turquia, as relações entre os dois países podem azedar rapidamente, o que poderia ter consequências graves, tanto econômicas quanto diplomáticas.
Em um momento em que a guerra na Ucrânia se intensifica, a exigência de Erdogan para a devolução da Crimeia coloca a Turquia em uma posição delicada. Se por um lado ele se apresenta como um defensor dos direitos humanos e dos tártaros da Crimeia, por outro, continua a manter laços importantes com a Rússia. Como esse jogo geopolítico se desenrolará, só o tempo dirá. Mas uma coisa é certa: Erdogan está fazendo movimentos estratégicos em um tabuleiro global cada vez mais complexo.
Fonte: Realidade Militar