Transmitida por contato próximo entre indivĂduos ou com animais infectados, a mpox é considerada endĂȘmica na África Central e na África Ocidental, com duas cepas diferentes, desde a década de 1970. Entre os anos de 2020 e 2023, a doença se espalhou rapidamente pelo mundo, com milhares de casos ligados à variante da África Ocidental relatados em mais de 110 paĂses.
No Ășltimo fim de semana, o diretor-geral da Organização Mundial da SaĂșde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, disse que considera convocar o comitĂȘ de emergĂȘncia da entidade para avaliar o cenĂĄrio de surto de mpox na África."À medida em que uma variante mais mortal da mpox se espalha por diversos paĂses africanos, a OMS, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças da África, governos locais e parceiros intensificam suas respostas para interromper a transmissão da doença", escreveu Tedros Adhanom em seu perfil na rede social X.
"Estou considerando convocar o ComitĂȘ de EmergĂȘncia de Regulamentos SanitĂĄrios para me aconselhar sobre se o surto de mpox deve ser declarado uma emergĂȘncia em saĂșde pĂșblica de interesse internacional", completou Tedros.
De acordo com o MSF, a mpox é classificada como endĂȘmica em pelo menos 11 de um total de 26 provĂncias da RDC. Em razão de um aumento acentuado de casos ao longo de mais de 2 anos, autoridades sanitĂĄrias do paĂs declararam epidemia da doença em dezembro de 2022. Em 2023, o nĂșmero de infecções triplicou, chegando a 14,6 mil notificações e 654 mortes.
"Em 2024, a situação piorou ainda mais. Entre janeiro e meados de julho, mais de 12,3 mil casos suspeitos foram relatados e 23 provĂncias foram afetadas", alertou a organização humanitĂĄria.
"A aceleração da epidemia é preocupante, especialmente porque uma mutação genética foi identificada na provĂncia de Kivu do Sul, com transmissão de humano para humano agora ininterrupta por meses. Isso ainda não havia sido identificado com a cepa da Bacia do Congo, ao contrĂĄrio da cepa da África Ocidental, que causou a epidemia global em 2022", explicou a MSF.
No fim de junho, a OMS chegou a alertar para uma variante mais perigosa da mpox. A taxa de letalidade pela nova variante 1b na África Central chega a ser de mais de 10% entre crianças pequenas, enquanto a variante 2b, que causou a epidemia global de mpox em 2022, registrou taxa de letalidade de menos de 1%. A entidade contabilizava, em junho, mais de 95 mil casos confirmados da doença em 117 paĂses, além de mais de 200 mortes.
"É um nĂșmero impressionante quando se considera que apenas alguns milhares de casos de mpox haviam sido relatados até então em todo o mundo e, de repente, estamos nos aproximando de 100 mil casos", destacou a lĂder técnica sobre varĂola dos macacos do Programa de EmergĂȘncias Globais da OMS, Rosamund Lewis.
Outro motivo de preocupação, segundo a MSF, é que a doença foi registrada em acampamentos de pessoas deslocadas em torno da cidade de Goma, em Kivu do Norte, onde a extrema densidade populacional torna a situação ainda mais crĂtica. "Existe um risco real de agravamento da situação, dados os enormes movimentos populacionais dentro e fora da RDC", alerta.
Nos Ășltimos dois anos, o paĂs registra movimentos regulares de pessoas que fogem de conflitos na provĂncia do Kivu do Norte e, mais recentemente, do Kivu do Sul. FamĂlias deslocadas procuraram refĂșgio, sobretudo, em acampamentos rudimentares nos arredores de Goma, onde o vĂrus foi identificado.
"A identificação de casos, o acompanhamento dos pacientes e os cuidados disponĂveis permanecem extremamente limitados, enquanto a falta de vacinas dificulta ainda mais a situação. Em algumas comunidades, a desinformação sobre a doença também complica a adesão das pessoas às medidas de saĂșde pĂșblica. Isso ilustra a necessidade de trabalhar em estreita colaboração com os lĂderes comunitĂĄrios para que todos passem a aderir às medidas", defende a organização humanitĂĄria.
A RDC jĂĄ validou pelo menos duas vacinas contra a mpox mas, no momento, nenhuma das doses estĂĄ disponĂvel, segundo o MSF. "As negociações estão em andamento com certos paĂses, e as ĂĄreas prioritĂĄrias estão sendo identificadas. Esperamos que as coisas sejam resolvidas em breve e que vacinas suficientes sejam fornecidas ao paĂs para atuar nas principais ĂĄreas epidĂȘmicas".
"Estamos trabalhando de vĂĄrias maneiras para ajudar a conter esse surto. Essa não é a primeira vez. As atuações de emergĂȘncia jĂĄ foram realizadas em 2021 na provĂncia de Mai-Ndombe, depois em 2023, e no inĂcio de 2024 na provĂncia de Equateur. Mas estamos intensificando nossos esforços devido aos desenvolvimentos recentes", informa a MSF.
A organização humanitĂĄria destaca que a epidemia de mpox na RDC se espalha em ĂĄreas com realidades demogrĂĄficas e geogrĂĄficas, muitas vezes, diferentes. Por isso, a resposta deve ser multissetorial e adaptada a cada contexto.
"Enquanto se aguarda a chegada das vacinas, o maior nĂșmero possĂvel de parceiros deve apoiar outros aspetos-chave da resposta, como anĂĄlises laboratoriais, vigilância, apoio ao isolamento e autoisolamento, sensibilização", avalia.
"Hoje, todos esses aspectos sofrem de deficiĂȘncias e exigem enormes recursos para funcionar adequadamente", pontuou o MSF. "Só podemos pedir que as vacinas cheguem ao paĂs o mais rĂĄpido possĂvel e em grandes quantidades, para que possamos proteger as populações nas ĂĄreas mais afetadas. Particularmente, as populações mais em risco, como os profissionais de saĂșde congoleses, que estão na linha de frente do combate à infecção, assim como outras populações em risco, como profissionais do sexo e pessoas deslocadas nos acampamentos".
A mpox é uma doença zoonótica viral. A transmissão para humanos pode ocorrer por meio do contato com animais silvestres infectados, pessoas infectadas pelo vĂrus e materiais contaminados. Os sintomas, em geral, incluem erupções cutâneas ou lesões de pele, linfonodos inchados (Ănguas), febre, dores no corpo, dor de cabeça, calafrio e fraqueza.
As lesões podem ser planas ou levemente elevadas, preenchidas com lĂquido claro ou amarelado, podendo formar crostas que secam e caem. O nĂșmero de lesões pode variar de algumas a milhares. As erupções tendem a se concentrar no rosto, na palma das mãos e na planta dos pés, mas podem ocorrer em qualquer parte do corpo, inclusive na boca, nos olhos, nos órgãos genitais e no ânus.
De acordo com a MSF, a mpox requer tratamento de suporte, de forma a controlar os sintomas da forma mais eficaz possĂvel e evitar mais complicações. A maioria dos pacientes tratados se recupera dentro de um mĂȘs, mas a doença pode ser fatal quando não tratada. Na RDC, onde a taxa de mortalidade da cepa existente é muito maior do que na África Ocidental, mais de 479 pessoas morreram desde o inĂcio do ano.
Em maio de 2023, quase uma semana após alterar o status da covid-19, a OMS declarou que a mpox também não configurava mais emergĂȘncia em saĂșde pĂșblica de importância internacional. Em julho de 2022, a entidade havia decretado status de emergĂȘncia em razão do surto da doença em diversos paĂses.
"Assim como com a covid-19, o fim da emergĂȘncia não significa que o trabalho acabou. A mpox continua a apresentar desafios de saĂșde pĂșblica significantes que precisam de resposta robusta, proativa e sustentĂĄvel", declarou, à época, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom.
"Casos relacionados a viagens, registrados em todas as regiões, demonstram a ameaça contĂnua. Existe risco, em particular, para pessoas que vivem com infecção por HIV não tratada. Continua sendo importante que os paĂses mantenham sua capacidade de teste e seus esforços, avaliem os riscos, quantifiquem as necessidades de resposta e ajam prontamente quando necessĂĄrio", alertou Tedros em 2023.
Fonte: AgĂȘncia Brasil