As oliveiras são famosas pela resistência à seca e ao calor, e já na
Grécia antiga eram um símbolo de força. Mas as mudanças climáticas estão
mostrando que mesmo elas têm um limite, atingido no verão passado no sul da
Europa, o mais quente em dois mil anos.
A árvore identifica o momento da floração pelas alterações de
temperatura, e uma primavera mais quente que o normal faz as flores
desabrocharem antes do tempo. Como resultado, o fruto – a apreciada azeitona –
perde em qualidade e quantidade. Além disso, em caso de seca extrema, a
oliveira pode nem produzir frutos naquele ano.
O sul da Europa é a maior região produtora de azeite de oliva do mundo.
Na safra de 2022/23, sua produção foi um terço menor que a anterior. A colheita
da nova safra começa só em outubro, os estoques estão baixos e o preço não para
de subir – inclusive no Brasil.
Em maio, a inflação do azeite em 12 meses atingiu 49% no Brasil, mais
que 12 vezes a inflação geral no período, de 4%. Uma garrafa de 500 mil é hoje
vendida por cerca de R$ 50, o que levou supermercados a protegê-las como fazem
com bebidas caras.
Especialistas ouvidos pela DW afirmam que a safra deste ano no sul da
Europa tende a ser melhor que a passada, mas a recuperação plena deve levar de
dois a três anos, se o clima permitir. Ao contrário de colheitas como a da soja
ou milho, na qual a cada ciclo a planta inteira é retirada, as oliveiras são
uma cultura permanente e as árvores levam um tempo para se recuperar após um
evento extremo.
Para os brasileiros que usam o azeite no dia a dia, as notícias não são
boas. O preço deve seguir nessa faixa ou subir ainda mais devido alta do dólar
– que na quarta-feira, 3, acumulava valorização de 17% sobre o real desde o
início do ano.
"Devido a questões climáticas, a produtividade das oliveiras no
Mediterrâneo diminuiu, e isso explica a alta do preço ao longo de 2023. Vemos
uma alta menor em 2024, mas os choques cambiais do momento terão reflexo nas
prateleiras, inclusive no azeite", diz Felippe Serigati, pesquisador do Centro
de Estudos do Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas (FGV Agro).
De onde vem o azeite consumido no Brasil
O Brasil é o segundo maior mercado consumidor de azeite do mundo, e também o
segundo maior importador, atrás somente dos Estados Unidos, afirma Renato
Fernandes, presidente do Instituto Brasileiro de Olivicultura (Ibraoliva). Os
brasileiros consomem cerca de 100 milhões de litros por ano, dos quais mais de
99% são importados.
O maior produtor mundial de azeite é a Espanha, que respondeu em 2022/23
por 28,6% do mercado, seguido por Turquia (13,9%), Grécia (12,8%) e Itália
(8,6%), segundo dados do Conselho Oleícola Internacional (IOC, na sigla em
inglês).
Por motivos históricos e de tradição comercial, o Brasil importa a maior
parte do azeite que consome de Portugal, responsável por 4,6% da produção
mundial. Em 2023, os brasileiros importaram cerca de 47 milhões de litros de
azeite de oliva português, quase quatro vezes mais que o volume comprado da
Espanha, no segundo lugar, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento,
Indústria, Comércio e Serviços.
O azeite de oliva produzido no Brasil é um mercado de nicho. Em 2023, a
safra foi de apenas 700 mil litros, a maior parte oriunda do Rio Grande do Sul.
Um efeito colateral do aumento do preço é o estímulo à adulteração. Em
março, o Ministério da Agricultura e Pecuária e a Polícia Civil do Rio de
Janeiro e a Polícia Militar de São Paulo realizaram uma operação contra a
adulteração de azeite de oliva com a adição ilegal de óleo de soja em uma
fábrica clandestina em Saquarema (RJ), que aprendeu 104 mil litros de produtos.
Além do problema com adulteração, Fernandes afirma que o Brasil tem um
"problema grave de classificação do azeite". Em 2023, uma análise não
representativa feita pelo Ministério do Agricultura com 46 amostras apontou que
82,6% delas tinham irregularidades na classificação – eram comercializadas como
extravirgem sem que atendessem aos padrões sensoriais dessa classificação
superior.
Espanha zera imposto sobre azeite
O brasileiro consome em média 500 gramas de azeite de oliva por ano, segundo o
IOC. Um volume pequeno se comparado aos países do sul da Europa, onde o azeite
é um item tradicional da dieta mediterrânea. Os espanhóis consomem 11,4 quilos
por ano, os gregos, 10,3 quilos, e os italianos, 7,1 quilos.
Na Espanha, o preço do azeite triplicou desde janeiro de 2021, e o
consumo caiu 20%, forçando o governo a agir. Em junho, as autoridades
anunciaram que a partir desta segunda-feira (01/07) até o final de setembro o
azeite de oliva ficará isento do imposto sobre valor agregado. De outubro a
dezembro, a alíquota será de 2% e, a partir do ano que vem, o produto será
considerado item de primeira necessidade, taxado a 4%.
A isenção do imposto sobre azeite de oliva foi uma das condições
colocadas pelo partido Juntos pela Catalunha para aprovar a prorrogação do
decreto anticrise do governo do premiê Pedro Sánchez em dezembro de 2023, mas
que ainda não havia sido implementada. A secretária do Tesouro espanhol, María
Jesús Montero, afirmou que a decisão refletia "a importância do azeite de oliva
na dieta mediterrânea e para um estilo de vida saudável".
A queda do consumo não atingiu somente os espanhóis. Uma pesquisa
divulgada no final de junho indicou que um terço dos italianos também havia
diminuído o consumo de azeite de oliva extra virgem em função da alta do preço.
Na Grécia, as perspectivas para a safra de oliveiras neste ano não são
boas, segundo a cooperativa de agricultores de Kalamata, a maior região
produtora de azeite do país. O inverno foi o mais quente desde o início dos
registros e as oliveiras floresceram antes da época, "o que certamente criará
problemas" para a safra, disse Michalis Antonopoulos em março à agência de
notícias Reuters.
Preparação para o futuro
O calor e a seca fora do comum não são o único problema para as oliveiras. Na
região central da Itália, em vez da seca, o problema climático deste ano para
os olivicultores foi o excesso de umidade na época da floração, que também
afeta o desenvolvimento dos frutos.
Uma situação parecida prejudicou os produtores gaúchos no ano passado,
quando o inverno mais ameno que o normal e o excesso de chuvas em setembro fez
com que muitas oliveiras não florescessem.
"Embora as mudanças climáticas, na média, elevem a temperatura, o fato
que mais tem prejudicado a produção agropecuária é a variabilidade climática.
Quando há onda de calor, é mais intensa, quando há queda de temperatura, também
é mais intensa – você torna o ambiente mais volátil", diz Serigati.
Uma alternativa para os olivicultores se prepararem para essa nova
realidade é pesquisar quais espécie de oliveiras se adaptam melhor a condições
de estresse hídrico ou de excesso de humidade, afirma Fernandes.
O setor também avalia medidas como cultivar mais de uma espécie na mesma
área, investir no cuidado do solo para proteger mananciais e melhorar a
retenção de água ou, no limite, mover as plantações para outras regiões.
Fonte: agoranoticiasbrasil.com.br/