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Entrevista: O destino de todos os políticos é o ocaso, diz Ciro Gomes após reconhecer isolamento político

Por Blog do Elias Hacker 26/05/2024 às 16:51:35

Ciro Gomes, ex-governador do Ceará — Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo

Ciro Gomes estĂĄ "saindo da toca" pela primeira vez desde a derrota nas eleições presidenciais de 2022. Pelo menos, foi como definiu em discurso em reunião na sede do PDT na última semana. Ex-governador do CearĂĄ e quatro vezes candidato à presidĂȘncia (1998, 2002, 2018 e 2022), o político se reuniu com O GLOBO para entrevista exclusiva, em que se diz "um amante não correspondido pelo Brasil".

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Na conversa, Ciro falou sobre seu futuro político e a decepção o último pleito presidencial. Admitiu ainda seu isolamento político, com aliados próximos fazendo parte do governo Lula, e tratou do rompimento com o irmão, Cid Gomes.

Em um discurso na quinta-feira na sede do PDT, o senhor disse que era a primeira vez que saía da toca desde quando perdeu a eleição em 2022. Por que ficou recluso?

A eleição me chocou profundamente e matou em mim a crença no sistema democrĂĄtico brasileiro. No minuto que perdi a eleição, senti uma espécie de deslegitimação do meu direito de participar.

Por causa dos 3% de votos que o senhor recebeu?

Os 3% foram a consumação desse processo. Nas outras eleições, tive 11%, 12%. Essa gente toda sucumbiu a uma onda fascista. Eu sabia que Lula não tinha a menor condição de entregar a tal esperança mistificadora que resumiu todo o drama para essa classe escolarizada de artistas e intelectuais. Como se o problema fosse nos livrarmos do Bolsonaro no primeiro turno, o que seria impossível. Bolsonaro não era um produto marciano, e sim do encontro trĂĄgico da pior crise econômica da história com o maior escândalo de corrupção (o petrolão) jĂĄ visto. Fiz um detox. Estou tentando ver se encontro outros modos prazerosos de exercitar minha vocação. Não quero mais depender da aprovação ou da crítica sebosa de eleitor.

Em entrevista, Ciro Gomes fala sobre isolamento político e briga com o irmão Cid — Foto: Brenno Carvalho / AgĂȘncia O Globo

O senhor brigou contra a polarização, mas ela permanece. Foi derrotado?

O Brasil estĂĄ derrotado, porque isso aniquila o nosso país. Isso só se resolverĂĄ quando Lula sair do jogo. Teve o 1Âș de maio vexaminoso, e a turma de Lula fica dizendo que organizaram errado. Não foi isso. Eles quebraram a lógica de representatividade da sociedade civil pela cooptação. O povo foi embora. E sabe quem estĂĄ falando para eles? A direita. Não na agenda real, mas na de costumes. A esquerda brasileira capitulou.

O senhor tem criticado o governo, mas o presidente do seu partido, Carlos Lupi, virou ministro da PrevidĂȘncia e o seu irmão Cid Gomes foi para o PSB, partido aliado do PT. O senhor estĂĄ ficando isolado?

Completamente. Mas minha posição não é anti-PT. É antimodelo. Não condeno ninguém. Lupi estĂĄ se esforçando como ministro. E, repare, se ele não aceita, Lula tinha ido em cima de um pedetista qualquer e estilhaçado o partido. Não vejo problema em contribuir. Sou apaixonado pelo Brasil. Apenas sou um amante não correspondido.

Política envolve o convencimento de outros, mas o senhor não tem conseguido convencer os que estão ao seu lado. Virou uma batalha quixotesca?

Virou. Portanto, tenho que mudar de linguagem. Tenho clareza disso. É a minha grande frustração. Nunca tive a ilusão de que esse conjunto de ideias pudesse ser popular. Mas não quero mais submetĂȘ-las a essa coisa eleitoral. Sou isolado? Sou. Imagina quantos isolamentos sofreu Getúlio Vargas. Brizola também morreu completamente isolado.

O isolamento se reflete também nas ofensas dirigidas à senadora Janaína Farias (PT), que resultaram numa denúncia do Ministério Público contra o senhor por violĂȘncia política de gĂȘnero?

Uma confusão que fizeram comigo, argumentando misoginia. Durante uma entrevista de 47 minutos, fiz uma denúncia contra o ministro da Educação (Camilo Santana) por dois minutos. Não foi contra a cidadã. Foi contra o ministro, que manipula de forma absolutamente patrimonialista e corrupta o CearĂĄ. Um monstro que ajudei a criar. Ele nomeou a primeira suplente para uma dessas secretarias para dar passagem à segunda suplente (Janaína Farias). Faça quatro perguntas bĂĄsicas a ela sobre geografia, economia, demografia do Ceará…VocĂȘ vai ver. Se fosse um homem, seria a mesma coisa. Mas, por ser mulher, não pode.

O senhor disse que ela era assessora para "assuntos de cama" e a chamou de "cortesã". Não é machismo?

Eu disse isso depois, porque é exatamente o que ela é. Falei que ela era incompetente e despreparada. Nessa entrevista, eu disse que não se faz uma obra pública no CearĂĄ sem cobrança de propina. Falei do patrimonialismo do Camilo Santana. Por isso, veio a derivação para o sexismo. Então, a mulher entra na política e é imune? Ela é, hoje, uma cortesã portando um mandato de senadora. Ela estĂĄ lĂĄ por um capricho do Camilo Santana ou porque ele estĂĄ sendo chantageado. Não estou falando dela. Estou falando do Camilo.

O senhor ficou anos tentando afastar a pecha de ser machista após ter dito que a função da sua ex-mulher Patrícia Pillar era dormir com o senhor…

Sabe por que eu enchi o saco da política? Por isso. Aconteceu hĂĄ 20 anos, jĂĄ me desculpei. O filho do Lula acabou de espancar a mulher e estĂĄ com medida protetiva do Tribunal de Justiça e esse assunto não estĂĄ na imprensa. E a dona Gleisi do PT faz uma nota me condenando por misoginia. Sou um cara sério, respeitador das mulheres.

Outra crítica que o senhor teve de lidar em sua vida política foi a de ser brigão. Recentemente, o senhor brigou até com seu irmão…

Fui eu? Então, foi. Lancei o Cid como candidato e me tornei inelegível no CearĂĄ por força da lei, aos 50 anos. Eu era unanimidade no estado. De repente, comecei a ter aresta. Todas para defender o Cid. Na última eleição, fui abandonado por todo mundo e por ele também. Fui eu quem briguei? Nunca briguei com ele. Nunca trocamos uma palavra ĂĄspera na vida.

Então, como foi o rompimento?

Simplesmente eu fui lĂĄ e pedi a ele: "Não faça isso, vocĂȘ estĂĄ me abandonando, e eu estou sozinho". Pedi para ele coordenar minha campanha, e ele disse que não.

VocĂȘs nunca mais se falaram? É algo que pode ser emendado?

Não. Não quero mais. Traição e ingratidão, sabe?

Após rompimento com Cid, houve debandada no PDT. Agora, o prefeito de Fortaleza, que é aliado do senhor, deve enfrentar dificuldades para a reeleição. O senhor se tornou um cabo eleitoral frĂĄgil?

Isso é tudo bobagem. Essa debandada não é para o Cid, que estĂĄ hospedado no partido (PSB) que é presidido pelo pai do Camilo, que é do PT. O destino de todos os políticos é o ocaso. A diferença minha é que eu sei disso e estou pronto. Sabe por quĂȘ? Porque sou desapegado.

O senhor diz que não pretende se candidatar a mais nada, mas Lupi falou na possibilidade de o senhor concorrer ao governo do CearĂĄ, enquanto alguns dizem que o senhor pode ir para a Câmara dos Deputados…

Nem pensar. Não pretendo abandonar o fazer política. Estou escrevendo um livro, tenho me reencontrado prazerosamente com o Tasso Jereissati. Houve essa conversa de uma federação com o PSDB. Lupi acha que é necessĂĄrio aprofundar um debate programĂĄtico. Eu também acho.

Fonte: O globo

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