A condução da política fiscal brasileira foi alvo de críticas de
ex-presidentes do Banco Central (BC) que participaram nesta sexta-feira (17) de
debate sobre os 30 anos do Plano Real, organizado pela autarquia. A mesa foi
moderada por Roberto Campos Neto, atual presidente do banco, e contou com a
presença dos ex-presidentes Gustavo Franco, Gustavo Loyola, Pedro Malan e
Persio Arida.
Malan, também ex-ministro da Fazenda, disse estar convencido de que a
sociedade brasileira assimilou os benefícios da preservação da inflação sob
controle, que influenciam no salário e transferência de renda, e disse
acreditar que o governante que tiver posição leniente com ela não se sairá bem
nas urnas.
Para ele, é possível compatibilizar compromisso fiscal e social, mas
isso exige uma definição clara de prioridades e avaliação de programas.
– Quando tudo é prioritário, nada é prioritário. Quando temos um
Orçamento com gastos que não são gastos e não devem ser considerados como tal,
é um problema sério que estamos construindo para o futuro – disse.
Arida disse que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi
arqui-inimigo do Plano Real e que propagou a retórica da "herança maldita", ao
suceder o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em 2003.
– Nosso tripé macroeconômico é manco hoje em dia, porque a perna fiscal
sofreu uma longa e contínua deterioração, e as perspectivas não são boas –
disse ele.
Para Gustavo Loyola, "é lamentável" que até agora o Brasil não tenha
resolvido seu problema fiscal, e isso é algo que pesa sobre o BC.
– Já houve várias ameaças à estabilidade. Felizmente, o Banco Central
tem se fortalecido ao longo do tempo, e hoje temos a nossa autonomia, mas
sofremos críticas e continuamos sofrendo críticas. Embora a estabilidade de
preço esteja imbricada fortemente no coração dos brasileiros, muitas vezes a
instituição é sujeita a críticas sem nenhuma base, críticas políticas e
populistas – disse ele.
Já Gustavo Franco lembrou que a discussão do Plano Real também passou
pela função de comitês e conselhos. Ele disse que, à época, o Comitê Monetário
Nacional (CMN) tinha um peso maior, mas também era muito "gastador". Para
Franco, o fortalecimento do Comitê de Política Monetária (Copom) é um bom
resultado dessa época.
AUTONOMIA
Campos Neto evitou comentários sobre a condução da política fiscal atual, mas
voltou a defender o projeto que concede autonomia financeira ao BC.
– O Banco Central sofre asfixia financeira e administrativa que nos
atrapalha muito e que é um grande problema, eu vejo isso como um grande
problema, um dos grandes desafios – disse ele, num raro momento em que desviou
do tema do debate.
Tramita no Congresso uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que
prevê autonomia adminitrativa e financeira para o BC. O texto tem o apoio de
Campos Neto, mas o governo é contrário. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad,
já afirmou que a proposta não tem o aval da pasta.
Relator da proposta, o senador Plínio Valério (PSDB-AM) disse que
prepara seu texto com concessões ao governo Lula, como a garantia de
subordinação da autarquia à política monetária do governo e a possibilidade de
o presidente da República pedir a demissão do presidente do BC.
Ainda que o Executivo tenha se oposto à PEC, Valério afirma que deverá
concluir o relatório até o fim de maio. A proposta original prevê que o BC
tenha autonomia administrativa e financeira sob supervisão do Congresso, o que
incomodou o Executivo. O governo alega perda de gestão da política monetária e
do instrumento para demitir o presidente da autarquia caso considere
necessário.
Fonte: agoranoticiasbrasil.com.br/