O governo federal recorreu ao tapetão para acabar com a desoneração da folha de
pagamentos de 17 setores da economia. O ministro do Supremo Tribunal Federal
(STF) Cristiano Zanin acatou pedido da Advocacia-Geral da União (AGU) e
considerou inconstitucional a desoneração da folha de pagamentos, na última
quinta-feira (25).
A renúncia fiscal entre abril e dezembro custaria aos cofres do governo
R$ 11,8 bilhões, que passarão a integrar o orçamento da União e encaminhar o
árduo trabalho da equipe econômica para chegar ao déficit zero em 2024.
O presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já disse que
vai recorrer caso o pleno do STF mantenha a decisão de Cristiano Zanin. A
medida está senado analisada em plenário virtual, com placar de 4 x 0 favorável
ao governo.
Já votaram para manter a decisão de Zanin: Flávio Dino, Gilmar Mendes,
Luís Roberto Barroso e Edson Fachin. Luiz Fux pediu vista (mais tempo para
análise) e tem 90 dias para apresentar voto.
Mesmo que o Supremo derrube a decisão monocrática de Zanin, os quase R$
12 bilhões que o governo vai arrecadar podem custar ainda mais caro pela judicialização
relacionada ao custo político com o Congresso.
O governo ainda trabalha para aprovar uma série de projetos, como:
Regulamentação da reforma tributária;
Flexibilização do arcabouço fiscal, que tramita no Senado;
Avanço de acordos para adiar uma sessão de vetos do Congresso Nacional. Nesta
pauta, Pacheco contribuiu para atender às vontades do governo de adiar a
sessão.
Em café com jornalistas na última terça-feira (23), o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva (PT) negou problemas entre Planalto e Congresso. No entanto,
Arthur Lira (PP-AL) já admitiu que o ministro das Relações Institucionais,
Alexandre Padilha, é um "desafeto pessoal". Além disso, a reação imediata de
Pacheco na desoneração aumentou as frentes de insatisfação no poder Legislativo.
Em entrevista coletiva na sexta (26), Pacheco afirmou que a posição do
Senado, neste momento, é de antagonismo ao governo federal e chegou a dizer que
a desoneração da folha de pagamento aos 17 setores não é problema do país,
afirmou que a "premissa" usada pela AGU "não é verdadeira" e subiu o tom ao
criticar a judicialização. A peça do governo atribuiu à desoneração o
desequilíbrio fiscal e o valor do dólar, entre outras medidas.
"A petição que parece muito catastrófica da AGU, como se a desoneração
da folha fosse o grande mal do país e os municípios brasileiros o grande
problema. É preciso, então, ter uma ampla discussão agora sobre gasto público e
corte de gastos por parte do governo federal. Qual é a proposta do governo?
Além de arrecadar, qual é a proposta do governo para equilibrar as contas?",
disse Pacheco, que ainda frisou que o fim da desoneração aos 17 setores pode
gerar desemprego e prejudicar a economia. A posição é acompanhada por
empresários dos setores e parlamentares.
Pode-se dizer que Pacheco "jogou na cara" do governo a ajuda do
parlamento para uma série de medidas. Outros parlamentares, como o autor do
texto da desoneração da folha de pagamentos, senador Efraim Filho (União-PB),
seguiram a mesma linha.
"Não faltaram gestos da parte do Congresso para atender à agenda
pró-arrecadação do governo. Aprovamos CARF, apostas online, fundos exclusivos,
offShores, novo ICMS, arcabouço [
] portanto, não faltaram compensações. Colocar
câmbio, desequilíbrio fiscal na conta da desoneração é injusto e equivocado. O
próprio governo fez o pedido de PEC da transição com R$ 180 bilhões extras de
orçamento e poderia qualificar melhor o gasto público", disse.
O relator da desoneração, Angelo Coronel (PSD-BA), disse que a peça da
AGU "não está com a verdade", e que a posição do governo de judicializar a
questão da desoneração demonstra uma "beligerância" do poder Executivo com o
Legislativo e é uma postura de quem quer "manter as tensões".
"O Congresso Naciona,l ao longo desse tempo de governo Lula, tem
atendido com total maestria, praticamente, todas as reivindicações do
Ministério da Fazenda. Houve um incremento de receita muito grande. Não podemos
aceitar que a AGU coloque dados que não são verdadeiros numa peça de alta
responsabilidade que é uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)", disse o
senador.
Além da desoneração, o presidente do Senado e do Congresso vem
capitaneando o avanço da PEC do Quinquênio, que concede reajustes e bônus a
integrantes do poder Judiciário a cada cinco anos. O governo é contra o avanço
da medida.
Segundo o Ministério da Fazenda, a desoneração da folha de pagamentos
"contraria o interesse público". O argumento é usado após o estudo "Desoneração
da Folha de Pagamentos — Análise setorial da política prorrogada e proposta de
revisão", publicado pela Secretaria de Política Econômica (SPE).
"Dado o elevado custo fiscal da medida, que implica menor
disponibilidade de recursos para outras políticas públicas essenciais, pode-se
concluir que a prorrogação irrestrita do modelo de desoneração presente
contraria o interesse público", diz o documento.
O documento da Fazenda diz ainda que a inconstitucionalidade da medida
está associada à proibição, a partir da reforma da previdência, do custeamento
do INSS por meio de contribuição substitutiva sobre a folha de salários.
"A incompatibilidade orçamentária se refere ao impacto – não orçado – de
R$ 15,8 bilhões estimados para 2024 (o ano todo), o que torna a medida
incompatível com a lei orçamentária de 2024, aprovada pelo Congresso Nacional",
diz o relatório.
Desde 2012, as desonerações — iniciadas no governo da ex-presidente
Dilma Rousseff (PT) — custaram R$ 150 bilhões aos cofres públicos.
O pingue-pongue da desoneração
10/2023
Em 25 de outubro, Congresso aprovou prorrogação da desoneração da folha
de pagamentos até 2027.
11/2023
Lula vetou o projeto e, diante dos protestos dos parlamentares, o
ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que encontraria solução para a
renúncia fiscal após o dia 12 de dezembro de 2023.
12/2023
Sem Haddad apresentar soluções, Congresso derrubou veto de Lula à medida
no dia 14 de dezembro, mas o governo insistiu. No apagar das luzes de 2023, foi
publicada uma medida provisória (MP) para reonerar a folha de pagamentos dos 17
setores, com efeitos a partir de 1º de abril.
Com mais protestos do Congresso, incluindo dos presidentes das duas
Casas, o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB), disse em
entrevista coletiva no último dia do ano que "acreditava no diálogo" para que a
MP da reoneração da folha de pagamentos fosse aprovada pelo Congresso.
02/2024
Lula retira trechos relacionados à reoneração da MP e manda ao Congresso
um projeto de lei (PL) em regime de urgência para ser debatido por deputados e
senadores.
04/2024
No dia 9 de abril, Senado aprovou requerimento de urgência para apreciar
projetos relacionados à desoneração da folha de pagamento. Mas, sem acordo
entre governo e Congresso, a urgência foi retirada.
Diante da indefinição, o governo resolveu entrar na Justiça por meio da
Advocacia-Geral da União e o ministro Cristiano Zanin julgou a medida
inconstitucional, em 25 de abril.
Fonte: agoranoticiasbrasil.com.br/