Entre os dias 19 e 26 de abril, o Supremo Tribunal Federal irá analisar uma
decisão liminar de 2016 que revogou o bloqueio judicial do WhatsApp em todo o
Brasil. Naquela ocasião, magistrados de Sergipe e do Rio de Janeiro haviam
ordenado a interrupção do uso do aplicativo no país após a empresa não entregar
à Justiça mensagens privadas de indivíduos investigados por tráfico de drogas.
A penalidade foi aplicada devido à não conformidade com a decisão judicial.
O PPS (agora conhecido como Cidadania) recorreu à Corte e, durante o
período de recesso, uma liminar foi concedida por Lewandowski para retomar o
serviço de mensagens. A decisão agora está nas mãos dos ministros, que
decidirão se mantêm ou revogam a medida. Espera-se que a decisão seja aprovada,
garantindo o funcionamento do WhatsApp. No entanto, os votos dos ministros
podem revelar diferentes opiniões sobre a capacidade do sistema judicial de
suspender ou não aplicativos de mensagens ou outras plataformas online que não
cumpram as decisões judiciais.
O motivo que levou o ministro Alexandre de Moraes a suspender o
funcionamento do Telegram em todo o país por dois dias em 2022, é o mesmo que
levantou a possibilidade de bloqueio da rede social X na semana passada.
Em 2016, durante a ação relacionada ao WhatsApp, o relator Edson Fachin
votou no mérito do processo em 2020, argumentando que nenhum juiz ou membro do
Judiciário deveria ter o poder de bloquear o aplicativo em todo o país, caso as
mensagens privadas não fossem fornecidas – apesar de serem permitidas pela
Justiça para violar a privacidade dessas comunicações. O WhatsApp não pode
acessar essas mensagens, pois são criptografadas "ponta-a-ponta", o que
significa que são codificadas de maneira tão secreta que apenas os próprios
participantes da conversa podem visualizá-las em seus dispositivos.
Fachin avaliou a questão e concluiu que a criptografia é uma tecnologia
que assegura, de maneira sólida, o direito fundamental à privacidade de todos
os usuários do aplicativo. Segundo o ministro, não seria equilibrado exigir que
o WhatsApp desativasse ou diminuísse a efetividade deste recurso, tornando os
usuários suscetíveis a invasões, para cumprir ordens judiciais.
Fachin acrescentou que o bloqueio geral do WhatsApp não poderia sequer
ser implementado pela Justiça, mas apenas pela Autoridade Nacional de Proteção
de Dados (ANPD), uma entidade técnica associada ao Executivo, caso o aplicativo
falhasse em proteger efetivamente os dados dos usuários.
"É inconstitucional proibir as pessoas de utilizarem a criptografia
ponta-a-ponta, pois uma ordem como essa impacta desproporcionalmente as pessoas
mais vulneráveis", disse Fachin em seu voto. "Fragilizar a criptografia é
enfraquecer o direito de todos a uma internet segura."
No período em que o julgamento foi iniciado no plenário do STF, a
ministra Rosa Weber, que agora está aposentada e era relatora de um caso
similar naquele momento, apoiou essa visão. Estavam sob análise aspectos do
Marco Civil da Internet que autorizam a interrupção de serviços online. No
entanto, Rosa Weber enfatizou que tal procedimento só seria admissível em
situações de quebra de sigilo de informações pessoais, e não por desobediência
a determinações para acessar conversas privadas.
"O que é apenada é a violação da privacidade e de outros direitos dos
usuários fora dos estritos limites legais. Nada há na Lei nº 12.965/2014 que
autorize a conclusão de que o art. 12, em seus III e IV, ampare ordens de
suspensão do serviço de comunicação oferecido por provedores de aplicativos em
caso de desatendimento de ordem judicial de fornecimento do conteúdo de
comunicações", afirmou a ministra.
Em maio de 2020, o julgamento foi pausado devido a um pedido de vista
feito por Alexandre de Moraes, que desejava uma análise mais aprofundada do
caso. Mais tarde, ele expressou sua discordância em relação às posições de
Fachin e Rosa Weber.
Ele aplicou a mesma regra do Marco Civil da Internet, que de acordo com
seus colegas, não deveria resultar na suspensão judicial do WhatsApp ou de
serviços de mensagens similares, e bloqueou o Telegram em março de 2022, por
não cumprir uma ordem que havia sido dada à plataforma.
A finalidade não era a obtenção de conversas privadas, como nas decisões
interrompidas por Lewandowski, mas sim o bloqueio dos canais de Allan dos
Santos, proprietário do site Terça Livre e um dos principais focos de Moraes na
investigação das "fake news". O Telegram não havia acatado várias ordens para
remover os canais da plataforma.
"O desrespeito à legislação brasileira e o reiterado descumprimento de
inúmeras decisões judiciais pelo Telegram, – empresa que opera no território
brasileiro, sem indicar seu representante – inclusive emanadas do Supremo
Tribunal Federal – é circunstância completamente incompatível com a ordem
constitucional vigente, além de contrariar expressamente dispositivo legal
(art. 10, § 1º, da Lei 12.965/14)", escreveu Moraes na decisão, citando a regra
do Marco Civil da Internet que permite o bloqueio.
Debate sobre a Interrupção de Serviços Online
O início do julgamento está previsto para 19 de abril e ocorrerá no
plenário virtual, onde os ministros apresentam seus votos por escrito ao longo
de uma semana. Não se trata de analisar o mérito da ação – a prioridade do
direito à comunicação para todos os usuários de um aplicativo de mensagens em
relação à necessidade de cumprir ordens judiciais para investigar um grupo
criminoso específico. O foco está apenas na liminar de 2016 de Lewandowski, que
analisa o tema de forma mais superficial.
Independentemente, Moraes tem a opção de submeter um voto escrito para
expressar sua perspectiva sobre o assunto, que difere de Fachin e Rosa Weber.
Isso abre a possibilidade de a Justiça utilizar o Marco Civil da Internet para
suspender aplicativos de mensagens, ou até mesmo outros serviços online como
redes sociais, que não cooperem com investigações criminais.
Em maio do ano passado, temendo esse risco, o WhatsApp enviou ao STF uma
manifestação reforçando que, apesar de não ter como abrir mensagens privadas de
seus usuários, colabora de outras formas com a Justiça. "A criptografia adotada
pelo WhatsApp não tem impedido as investigações. Pelo contrário, o WhatsApp
fornece dados que contribuem muito com as autoridades investigativas, incluindo
informações de grupos, contatos, foto de perfil, endereços/registros de IPs e
informações sobre quem fala ou envia mensagens para quem e quando. Tanto é
assim que há muito não há notícia de novas ordens de bloqueio ou imposição de
outras sanções contra o WhatsApp", afirmaram os advogados da plataforma no
Brasil.
Fonte: As informações são da Gazeta do Povo.