Os senadores aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) iniciaram
articulações em busca de apoio pela abertura de uma CPI para apurar as
acusações do tenente-coronel Mauro Cid de que a Polícia Federal tenta manipular
seus relatos feitos em acordo de delação premiada.
Na visão de parlamentares, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro imputa
os crimes de constrangimento ilegal, falsidade ideológica, prevaricação e abuso
de autoridade à PF, além de envolver o STF (Supremo Tribunal Federal) nos
possíveis delitos.
O advogado de Bolsonaro, Fabio Wajngarten, por sua vez, afirma que os
relatos de Cid são graves e precisam ser apurados. "Os áudios são gravíssimos e
merecem as devidas investigações com relação ao cumprimento do devido processo
legal, bem como a isenção de quem quer que seja", diz à reportagem.
Os áudios em questão foram revelados pela revista Veja na quinta-feira
(21). Neles, o militar afirma que a Polícia Federal tem uma narrativa pronta
nas investigações contra Bolsonaro e seu entorno e diz que o ministro Alexandre
de Moraes, que homologou sua delação premiada, já tem a sentença do caso, mesmo
antes de as investigações acabarem.
O senador Eduardo Girão (Novo-CE) acredita necessário o Senado
investigar os fatos narrados por Cid porque o Supremo não teria imparcialidade,
uma vez que é alvo das acusações.
Ele diz que oposicionistas do governo Lula (PT) no Congresso Nacional se
articulam em busca das assinaturas necessárias para abrir uma CPI sobre o caso.
"Já temos alguns nomes da oposição e independentes. Mas ainda em
construção coletiva do texto que ajustaremos durante o final de semana. Na
próxima semana buscaremos mais apoiamentos", afirma.
Nos bastidores, parlamentares próximos ao presidente do Senado, Rodrigo
Pacheco (PSD-MG), acham que é baixa a chance de o chefe da Casa Legislativa
acatar a demanda da oposição e instalar uma comissão que desagradaria o
Supremo.
Os senadores bolsonaristas, entretanto, estudam estratégias para
pressionar Pacheco por entenderem que o caso é grave.
"Essa CPI é necessária para passar a limpo os abusos que o STF é acusado
de cometer e que poderia macular também a imagem de uma Instituição bastante
acreditada pelos brasileiros como a PF", afirma Girão.
Ele entende que "a apuração é possível já que todo o depoimento precisa
ter sido gravado por força de lei", o que facilitaria o trabalho da comissão
parlamentar de inquérito. "O relato é muito grave e parece ser mais crível
ainda devido a espontaneidade e por ele ter gravado o áudio enquanto estava
solto", diz.
Os áudios foram revelados na quinta-feira e, nesta sexta-feira (22), Cid
foi preso por ordem de Moraes. Conforme o gabinete do ministro, ele foi preso
por "descumprimento das medidas cautelares e por obstrução à Justiça".
A PF também cumpriu nesta sexta um mandado de busca e apreensão na casa
do ex-assessor de Bolsonaro.
Segundo integrantes da PF, o tenente-coronel feriu o acordo de confidencialidade
da colaboração premiada, o que foi considerado como o descumprimento de uma
medida cautelar. Ele fez isso, avaliam investigadores, para tentar atrapalhar a
apuração, sendo suspeito de obstrução de Justiça.
O Supremo também informou que está sob análise a homologação da delação
feita pelo militar, já que os termos não foram tratados pela corte e, sim,
pelos investigadores.
Nos áudios em questão, Cid afirma ainda a um interlocutor que os
policiais queriam que ele falasse o que não sabe ou o "que não aconteceu".
"Você pode falar o que quiser. Eles não aceitavam e discutiam. E
discutiam que a minha versão não era a verdadeira, que não podia ter sido
assim, que eu estava mentindo", disse o ex-ajudante de ordens.
Segundo a revista, a gravação é da semana passada e ocorreu após Cid
prestar depoimento por nove horas à Polícia Federal. No áudio, ele afirma que
os policiais só queriam "confirmar a narrativa deles" e a todo momento davam a
entender que ele poderia perder os benefícios da delação premiada a depender do
que contasse.
Cid também teria feito críticas a Moraes, relator das investigações
contra o ex-presidente em curso no STF.
"O Alexandre de Moraes é a lei. Ele prende, ele solta, quando ele
quiser, como ele quiser. Com Ministério Público, sem Ministério Público, com
acusação, sem acusação", afirma.
Fonte: Folhapress