A decisão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) e do governador Tarcísio de
Freitas (Republicanos) de ir à manifestação convocada pelo ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL) surpreendeu parte do bolsonarismo, que elogia o gesto a favor do
aliado.
O prefeito já afirmou que não pretende discursar. Já Tarcísio deve fazer
uso da palavra, segundo o próprio Bolsonaro –informação ainda não confirmada
por sua assessoria. O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), também
confirmou presença no ato deste domingo.
Nunes, que concorre à reeleição com o apoio explícito de Bolsonaro,
declarou que irá ao ato deste domingo (25), na avenida Paulista, apesar dos
apelos contrários de emedebistas, que temem a rejeição do ex-presidente no
eleitorado da capital e a associação com o suposto golpismo.
Além disso, as imagens do prefeito ao lado de Bolsonaro serão exploradas
pelo adversário Guilherme Boulos (PSOL), que tem o apoio de Lula (PT) e quer
nacionalizar a eleição de São Paulo.
Estrategistas de Nunes, contudo, minimizam o prejuízo eleitoral. Na
verdade, defendem haver ganho em fidelizar o apoio dos bolsonaristas, já que a
esquerda não votaria no prefeito de qualquer forma.
Aliados de Nunes dizem que a decisão dele de comparecer foi pessoal.
Embora o prefeito simpatize com o ex-presidente, seus movimentos de aproximação
e afastamento em relação a Bolsonaro envolvem cálculo eleitoral e um cabo de
guerra entre bolsonaristas e emedebistas.
Na última segunda-feira (19), em evento na prefeitura, Nunes aproveitou
para reforçar pontos que equilibram seu vínculo com Bolsonaro, como a defesa da
vacina e a posição de centro do MDB. Para sua equipe, a postura do
ex-presidente na pandemia explica sua derrota e, por isso, Nunes deve ressaltar
sua discordância nesse ponto.
Ao longo da semana, por outro lado, Nunes defendeu Bolsonaro dizendo que
o ex-presidente tem presunção de inocência. "Eu sou um fiel defensor da
democracia. [
] Manifestação é ato legítimo e sublime da democracia, só não
pode ter baderna e não pode ter ofensa", disse na quarta (21).
Auxiliares do prefeito e também bolsonaristas avaliam que havia pouca
margem para que ele não fosse ao protesto após a convocação geral de Bolsonaro,
já que o eleitorado do ex-presidente cobra fidelidade e caberia a Nunes
retribuir o apoio nesse momento de fragilidade.
Com o ato, Bolsonaro busca se blindar do inquérito do STF que investiga
uma suposta tentativa de golpe de Estado.
A ausência, portanto, faria um estrago na imagem do prefeito perante a
direita bolsonarista, que não vê em Nunes o candidato dos sonhos, mas o
possível –e só deve votar nele depois de Bolsonaro ter deixado claro que apoia
o emedebista em detrimento de Ricardo Salles (PL), que também estará no ato.
Há, inclusive, receio de que Nunes seja vaiado pelo público, mas
bolsonaristas dizem acreditar que isso não acontecerá, afinal o prefeito estará
respaldado por Bolsonaro.
"A gente espera de Nunes e de Tarcísio gestos pró-Bolsonaro. Os aliados
são esperados em momentos difíceis. Acho que Nunes só ganha com isso, é um
gesto público de aproximação. Ele assumiu riscos, comprou briga com o partido
dele, é um gesto bem grande", disse à reportagem o deputado estadual
bolsonarista Gil Diniz (PL).
Fabio Wajngarten, braço direito de Bolsonaro e crítico de políticos que
aproveitam seu potencial eleitoral, mas não o defendem, disse que o ato é uma
"demonstração enorme força política" do ex-presidente. "Nesse momento todos os
apoios são extremamente bem-vindos."
À esquerda dos bolsonaristas, Soninha Francine, secretária da gestão
Nunes, criticou a decisão do prefeito de ir ao ato, enquanto Aloysio Nunes
(PSDB), ex-secretário, disse que a manifestação é "suicídio político coletivo".
Tarcísio, por sua vez, também acumula seus altos e baixos na relação com
o ex-presidente e com os bolsonaristas ao apostar num estilo mais ponderado e
dialogar com opositores, sem deixar de comprar parte das pautas da extrema
direita.
De acordo com aliados, caso ele discurse, terá um tom moderado como de
costume. O governador vai hospedar Bolsonaro no Palácio dos Bandeirantes para o
ato.
Assim como Nunes, Tarcísio é cobrado por aliados do ex-presidente a
defendê-lo. Ele tem sido pressionado por não ter se manifestado publicamente a
favor de Bolsonaro após a operação da Polícia Federal que o atingiu.
Ao contrário de Bolsonaro, Tarcísio buscou não comprar briga com os
demais Poderes e, por isso, deputados bolsonaristas chegaram a duvidar da sua
presença
Parte deles afirma acreditar que o governador não estará confortável no
palanque, mas interlocutores de Tarcísio dizem que não há incômodo e que, sendo
aliado de Bolsonaro, não poderia faltar a um ato importante. Na terça (20),
Tarcísio não quis responder a jornalistas sobre o ato.
Ainda de acordo com o entorno do governador, ir à Paulista ajuda a
equalizar seus gestos. Era esperado um aceno para a direita bolsonarista depois
de encontros com dois dos principais adversários do ex-presidente.
No último dia 2, Tarcísio esteve com Lula em Santos (SP) para anunciar
um acordo para a construção do túnel até Guarujá (SP). A cena em que o
presidente arranca risadas do governador incomodou os militantes mais radicais.
Já na sexta (23), Tarcísio elogiou a Justiça Eleitoral em evento com
presença do presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Alexandre de
Moraes, que atua nos inquéritos que envolvem Bolsonaro.
Tarcísio é, inclusive, uma das saídas encontradas por Nunes –como mostrou o
Painel, o prefeito avalia ir ao ato com o governador para dividir o peso de
aderir à manifestação.
Na opinião de emedebistas, Nunes já demonstrou quem ele é e sua ligação
com o MDB, partido de oposição à ditadura, portanto um ato isolado não irá
levá-lo para a extrema direita.
"Nosso intuito é construir um arco de alianças que realmente represente
uma diversidade de forças políticas. O Ricardo Nunes é MDB raiz e não tem um
padrinho político. Ele tem a trajetória dele", diz o presidente do MDB
municipal, Enrico Misasi.
Fonte: CAROLINA LINHARES SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)