Sempre que cobrados sobre obras pĂșblicas, os chefes do Executivo costumam justificar a falta delas a partir da indisponibilidade de orçamento. Quando o tema é educação, no entanto, os erros de gestão também ficam claros. Levantamento feito por O TEMPO junto à base de dados do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) mostra que 727 obras em escolas estão paradas em Minas Gerais após a assinatura de convĂȘnios com o Ministério da Educação (MEC) entre 2011 e 2014: 438 na rede municipal e 289 na estadual.
As falhas vão desde a rede municipal e estadual até a União, passando por mau uso do dinheiro pĂșblico e por promessas não cumpridas. Em 500 dessas intervenções (68,7% do total), por exemplo, prefeituras e governo Romeu Zema (Novo) jĂĄ receberam algum recurso para executĂĄ-las, mas não houve conclusão por diferentes motivos.
Na rede estadual, quatro convĂȘnios para a construção de quadras escolares servem de exemplo: o MEC repassou 100% do recurso prometido, os termos venceram, mas a gestão Zema não concluiu o serviço. São duas em Juiz de Fora (Zona da Mata), uma em Cambuquira (Sul) e outra em ItajubĂĄ (Sul).
Outro caso emblemĂĄtico é da Escola Estadual IndĂgena Bakinuk, em São João das Missões, no Norte do Estado. Minas recebeu do governo federal 99,7% dos recursos empenhados para a construção de uma quadra esportiva coberta na instituição. A obra não terminou, e o convĂȘnio venceu em junho do ano passado.
Cada quadra como essa estĂĄ orçada em R$ 355 mil pelo FNDE. Ou seja, juntando os casos das cinco estruturas pelas quais Minas recebeu praticamente a totalidade do recurso prometido, cerca de R$ 1,4 milhão entrou no caixa do governo, mas não resultou na entrega total do empreendimento contratado.
Quando os olhos se voltam a todas as obras canceladas, paralisadas ou inacabadas na rede estadual no âmbito dos convĂȘnios do FNDE, com contratos vigentes ou vencidos, os nĂșmeros chamam ainda mais a atenção: são 289 intervenções paradas: nove escolas, 198 quadras esportivas cobertas e 82 coberturas de quadras a menos na estrutura do Estado. São R$ 15,8 milhões (cerca de 20% do pactuado) que entraram nos cofres pĂșblicos mineiros para a execução de obras com futuro, no mĂnimo, incerto. Entre elas, estĂĄ a quadra da Escola Estadual Dom Cabral, no bairro Betânia, região Oeste de BH, hoje completamente desgastada pela ação do tempo. O termo era para a construção de uma estrutura nova e coberta. Minas recebeu R$ 49 mil dos R$ 245 mil pactuados para essa obra.
"É preciso saber os motivos dos cancelamentos desses convĂȘnios. É preciso processos de investigação para ver se tudo foi bem cuidado, se não teve prejuĂzo ao erĂĄrio. Se por acaso gastou mais ou pegou o recurso e não gastou, vocĂȘ tem consequĂȘncias jurĂdicas para proteger o erĂĄrio e sanções pessoais contra os agentes pĂșblicos e polĂticos envolvidos. Se não hĂĄ prestação de contas devida ou desvio desse recurso para outras finalidades, o caso se enquadra como improbidade administrativa", diz o advogado e professor de direito constitucional Antonio Carlos de Freitas JĂșnior.
Secretaria contesta dados do ministério
Em nota à reportagem, a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE-MG) deu nĂșmeros diferentes da base de dados do governo federal. A pasta informa que pactuou 571 obras por meio do FNDE, sendo que 306 foram concluĂdas e 265 "encontram-se em execução e/ou instrução de processo licitatório".
"É importante destacar que as obras paralisadas, deixadas por gestões passadas, foram retomadas pela gestão atual, estão em andamento para serem concluĂdas e entregues à comunidade escolar.
Para o especialista em direito constitucional Antonio Carlos Freitas JĂșnior, quando o recurso prometido não é totalmente transferido pela União, não hĂĄ culpa do governo de Minas Gerais quando a obra não é entregue.
Dos 21 termos vencidos durante o governo Romeu Zema, só quatro receberam a totalidade dos recursos empenhados: as quadras escolares de Juiz de Fora, ItajubĂĄ e Cambuquira, além da situação da cobertura da quadra esportiva da Escola Estadual IndĂgena Bakinuk, em São João das Missões, pela qual Minas recebeu 99,7% do pactuado.
Acordos vencem sem conclusão do serviço
Outro caso que chama atenção é dos 22 convĂȘnios entre Minas e o FNDE que venceram sem que as obras fossem entregues (paralisadas, canceladas ou inacabadas) – 21 deles ultrapassaram o tempo-limite previsto no termo durante o governo de Romeu Zema.
No entanto, vale ressaltar que o fundo da União repassou recursos só para 13 dessas intervenções. Portanto, outros nove termos venceram sem receber um centavo sequer – o que deixa claro o descaso do governo federal com a questão.
Ainda assim, o Estado recebeu R$ 3,6 milhões por essas intervenções em escolas estaduais que nunca foram inauguradas.
Vice-presidente da Comissão de Educação, CiĂȘncia e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, a deputada estadual Macaé Evaristo (PT) explica os motivos por trĂĄs do problema. Apesar de ressaltar que os casos variam, o que dificulta a anĂĄlise generalista, a parlamentar aponta erros. "Tinha uma dinâmica do FNDE que era de liberar um percentual do recurso, depois fazer a medição (avaliação da obra). Se a medição estava OK, se liberava a outra parte do recurso. Nunca era na Ăntegra. Só que o FNDE e o MEC foram dissolvidos na gestão passada (do governo federal). Não funcionava com regras claras", afirma.
O tempo