A Justiça de Minas Gerais deu prazo de dois dias para que a Vale, o
Ministério Público e a Defensoria Pública do estado apresentem esclarecimentos
a respeito de cláusulas de acordos extrajudiciais oferecidos pela mineradora a
familiares de vítimas e sobreviventes do rompimento da barragem de Brumadinho,
que completará cinco anos na próxima semana.
O despacho da 2ª Vara de Fazenda Pública de Belo Horizonte, que ordena a
intimação da empresa, do MP e da Defensoria, foi assinado pelo juiz Murilo
Silvio de Abreu em uma ação civil pública que questiona o uso de acordos
individuais para encerrar ações judiciais em andamento.
A ação civil pública na Justiça mineira, movida pelo Instituto Raymundo
Campos, alegou que a Vale tem incluído cláusulas abusivas nos acordos
individuais, não previstas no termo de compromisso assinado entre a mineradora
e a Defensoria Pública mineira, em abril de 2019. O termo pretendia acelerar
indenizações e preservar direitos das vítimas do desastre de Brumadinho.
O instituto afirmou à Justiça que a Vale passou a exigir "quitação ampla
e irrestrita" nos acordos, renúncia a direitos e desistência de ações judiciais
relacionada ao rompimento da barragem, no Brasil e no exterior, além de
imposição de sigilo e declarações de que o signatário do acordo compreende
todos os seus termos e efeitos jurídicos.
Familiares das vítimas de Brumadinho movem ao menos uma ação no exterior
com valores muito superiores ao do acordo proposto pela Vale. Na Alemanha, a
certificadora Tüv Süd, empresa contratada pela Vale para atestar a estabilidade
da barragem na época do rompimento, precisará pagar a partir de R$ 2 milhões a
cada pessoa que perdeu um ente na tragédia, a depender do grau de parentesco, e
R$ 4 milhões por dano morte, se for condenada. As indenizações aos
sobreviventes partem de R$ 350 mil.
A ação pede à Justiça que determine à Vale a interrupção das ofertas de
acordos individuais desalinhados com o compromisso firmado entre a mineradora e
a Defensoria, a "ineficácia" das cláusulas consideradas abusivas e a
notificação de comarcas do Tribunal de Justiça de Minas Gerais de que a
homologação de acordos individuais pela tragédia de Brumadinho seja feita com
base no termo de compromisso.
"As cláusulas que constam nestes acordos individuais propostos pela Vale
quase 5 anos após o Rompimento não encontram guarida no Termo de Compromisso
firmado com a Defensoria Pública em 2019 e mais: aos beneficiários sequer foi
possibilitada a negociação dos termos de determinadas cláusulas do acordo, o
que foi reiteradamente rechaçado pela Vale em uma verdadeira postura de "pegar
ou largar"", disse a ação civil.
O que dizem os acordos da Vale
A coluna revelou, em setembro de 2023, o conteúdo dos acordos oferecidos
pela Vale aos familiares das vítimas da tragédia de Brumadinho.
O texto prevê o pagamento de R$ 100 mil para aqueles que desistirem de
ações judiciais referentes aos danos extrapatrimoniais causados pelo rompimento
da barragem. A Vale considera que os danos extrapatrimoniais incluem "danos
morais, psicológicos, psiquiátricos, abalo à saúde mental/emocional e/ou
qualquer outro tipo de dano, de natureza punitiva, exemplares, compensatórios e
consequenciais".
A empresa diz ainda que os signatários do acordo reconhecerão que o
pagamento da indenização ocorre sem "qualquer admissão de responsabilidade" da
Vale pela "ocorrência do rompimento".
Entre as exigências para assinar o acordo está também desistência de
"todas e quaisquer demandas judiciais e/ou administrativas iniciadas no Brasil
ou em qualquer outro país" referentes ao rompimento da barragem. Também está
previsto que os signatários reconheçam que não têm mais "qualquer direito
extrapatrimonial – direto ou indireto".
Na ocasião, a Vale afirmou que está comprometida em indenizar de forma
definitiva e integral todos os atingidos pelo rompimento da barragem em
Brumadinho. "As indenizações respeitam e seguem as premissas previstas no Termo
de Compromisso firmado com a Defensoria Pública de Minas Gerais. Todos os
acordos celebrados são levados à homologação pelo Poder Judiciário", informou a
empresa.
Fonte: Metropoles