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PT critica poder do Centrão e austericídio fiscal às vésperas de mudanças na equipe de Lula

Por Redação 08/12/2023 às 08:11:25

Foto: Marina Ramos/Arquivo/Agência Câmara

A cúpula do PT vai aprovar nesta sexta-feira, 8, uma resolução política na qual critica a influĂȘncia "desmedida" do Centrão sobre o governo Lula e o Legislativo, ataca o chamado "austericídio fiscal" e diz que temas como segurança pública e papel das Forças Armadas não podem ser tratados como "tabus". Embora faça uma avaliação positiva do primeiro ano de governo do presidente Luiz InĂĄcio Lula da Silva, o PT prega a alteração, com urgĂȘncia, da correlação de forças que domina o cenĂĄrio político nesse terceiro mandato.

A proposta de resolução, apresentada pela corrente Construindo um Novo Brasil (CNB) – majoritĂĄria no PT – ainda pode receber emendas e sofrer ajustes na reunião do Diretório Nacional. O encontro ocorrerĂĄ nesta sexta, pouco antes de Lula, o principal integrante da CNB, abrir a ConferĂȘncia Eleitoral do partido.

Com o texto, o PT marca posição no momento em que Lula discute mudanças nos ministérios. O Centrão selou aliança com o governo em setembro, quando André Fufuca (PP) substituiu Ana Moser em Esporte e Sílvio Costa Filho (Republicanos) entrou no lugar de MĂĄrcio França (PSB) em Portos e Aeroportos. O acordo em troca de votos no Congresso foi articulado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

Agora, a próxima mexida na equipe serĂĄ no Ministério da Justiça. Como mostrou o Estadão, o nome mais cotado para substituir o titular da pasta, FlĂĄvio Dino, é o de Ricardo Lewandowski. Dino foi indicado por Lula para ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF) e passarĂĄ por sabatina no Senado, no próximo dia 13. Lewandowski jĂĄ presidiu o Supremo e deixou a Corte em abril.

"Meu relacionamento com o presidente Lula é respeitoso e cordial. Fico lisonjeado com a lembrança do meu nome, mas, de fato, tudo é mera especulação, por enquanto. Não tive essa conversa com o presidente", disse Lewandowski ao Estadão. O magistrado aposentado desembarcou no Brasil nesta quinta-feira, 7, após viajar com o presidente para o Oriente Médio e a Alemanha.

Lula só anunciarĂĄ o novo titular da Justiça após Dino passar pela sabatina no Senado. Ele tratou do assunto com a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, durante encontro no Rio, onde nesta quinta participou do Cúpula do Mercosul.

Gleisi fica no comando do PT até eleições
A intenção do presidente é fazer uma reforma ministerial mais ampla só no ano que vem, até abril, quando quem for disputar eleições municipais deve entregar os cargos. Lula pretende deixar Gleisi no comando do PT até o fim de 2024 para não abrir uma disputa interna pela cadeira nem mexer na direção do partido em uma época de eleições municipais. Depois dessa etapa, porém, ela seria puxada para o primeiro escalão do governo.

Gleisi é uma das vozes mais fortes contra o movimento feito pelo Centrão para pressionar o PalĂĄcio do Planalto a ceder cargos e aumentar as emendas parlamentares destinadas ao grupo.

"As forças conservadoras e fisiológicas do chamado Centrão, fortalecido pela absurda norma do orçamento impositivo num regime presidencialista, exercem influĂȘncia desmedida sobre o Legislativo e o Executivo, atrasando, constrangendo e até tentando deformar a agenda política vitoriosa na eleição presidencial", diz a proposta de resolução apresentada pela tendĂȘncia CNB e obtida pelo Estadão. "(…) É urgente, no entanto, nos organizarmos politicamente para alterar esta correlação de forças, o que só se darĂĄ pela conscientização e mobilização daqueles e daquelas que representamos e defendemos."

Em outro trecho do documento, hĂĄ alfinetadas na direção do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Ao destacar que o país ainda tem reservas internacionais de US$ 350 bilhões, o texto do PT diz que não faz sentido, neste cenĂĄrio, "a pressão por arrocho fiscal exercida pelo comando do BC, rentistas e seus porta-vozes na mídia e no mercado".

Apesar de não citar a meta de déficit zero estabelecida para as contas públicas de 2024, a resolução que passarĂĄ pelo crivo do Diretório Nacional não deixa dúvidas sobre a discordância em relação à proposta do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

"O Brasil precisa se libertar, urgentemente, da ditadura do BC "independente" e do austericídio fiscal, ou não teremos como responder às necessidades do país", sustenta o documento.

"Companheiro Haddad" entra e sai do texto
A primeira versão do texto da CNB, à qual o Estadão teve acesso, fazia até um elogio a Haddad. Dizia que "graças à credibilidade de Lula e à política econômica coordenada pelo companheiro Fernando Haddad, temos inflação cadente e sob controle, desemprego em queda, rendimento da população em alta e contas públicas equilibradas".

O início da frase, porém, foi substituído por "Graças à credibilidade de Lula e apesar do BC de Campos Neto (…)". A última versão serĂĄ votada nesta sexta-feira.

A autonomia do Banco Central é ironizada pelos petistas quando o texto se refere implicitamente à desaceleração do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre.

"O PIB só não foi maior por causa da deletéria política de juros do Banco Central "independente"", diz a proposta de resolução. "Indicado por Jair Bolsonaro e pelo igualmente deletério ex-ministro Paulo Guedes, o ainda presidente do BC, Roberto Campos Neto, mantém com seus diretores a maior taxa de juros do planeta, sem que haja nenhuma justificativa plausível para essa barbaridade."

No diagnóstico do partido, a política de juros "sobrevive como um prolongamento do governo anterior", sabotando o crescimento da economia.

Petistas defendem Múcio fora da Defesa
Ao dar a largada para a pré-campanha de 2024, o PT também assinala que travarĂĄ um duro embate com a extrema-direita nas eleições municipais. Afirma que, a partir dessas disputas, serĂĄ possível "organizar e consolidar a base popular necessĂĄria para mudar a correlação de forças políticas e mudar o Brasil".

O documento menciona os atos golpistas de 8 de janeiro e diz que isso foi a "segunda derrota dos extremistas antidemocrĂĄticos", após o revés nas eleições. "O fato de eles permanecerem mobilizados contra o país, quase um ano depois, impõe a necessidade de responsabilizar e punir, de maneira firme e pedagógica, os comandantes políticos do golpismo, civis ou militares, a começar por Jair Bolsonaro, para que nunca mais voltem a ameaçar a democracia".

A referĂȘncia ao ex-presidente, tratado como "um adversĂĄrio sem escrúpulos", permeia o texto. Para o PT, Bolsonaro se associou a "comandantes militares desonrados", com o objetivo de "ameaçar e contestar" o processo eleitoral.

A certa altura, o partido cita o fato de Lula ter revogado "atos criminosos de Bolsonaro", que liberavam a venda e a posse de armas. Mais adiante, diz ser preciso investir em uma "estratégia de comunicação política" para denunciar fake news.

"É tarefa do PT, de nossos dirigentes e militantes, seguir incidindo sobre a elaboração e implantação de políticas públicas em todos os setores, inclusive sobre temas como Segurança Pública e o papel das Forças Armadas, que não devemos tratar como tabus", afirma o texto.

Em conversas reservadas, dirigentes do PT avaliam que o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, atua como um "braço dos militares contra o poder civil" e defendem a mudança do currículo adotado nas escolas de formação de oficiais, considerado "pró-ditadura". A opinião consta de uma texto divulgado como contribuição ao debate do Diretório Nacional por Valter Pomar, da Articulação de Esquerda, e tem o apoio da maior parte da cúpula do PT, que defende a saída de Múcio.

A criação do Ministério da Segurança Pública, ĂĄrea que hoje estĂĄ subordinado à Justiça, consta do programa de governo de Lula desde 2002. Quando Dino foi escolhido para comandar a Justiça, no entanto, convenceu o presidente eleito de que essa divisão seria ruim porque o ministro perderia força e ficaria como uma espécie de "rainha da Inglaterra", se não pudesse comandar a Polícia Federal.


Fonte: Vera Rosa/Estadão ConteĂșdo

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